Sociedade

A médica familiar ao serviço das comunidades rurais

Fernanda Pequenino e José Chaves | Andulo

Jornalistas

Ana Maria Samuel nasceu no dia 3 de Março de 1966, na província do Huambo, é a primogénita de Adelino Chamolehã e Maria Imaculada. “Tenho três irmãos, todos nascemos e crescemos na comuna sede do Huambo, no sector do Cambiote, na Correa concretamente”, lembra.

29/03/2024  Última atualização 12H51
Irmã Ana Maria Samuel © Fotografia por: Edições Novembro
"O nosso hospital era a Missão do Cuando, na província do Huambo, onde o meu irmão mais novo era quase sempre internado, por ter sido uma criança que muito adoecia e quem a assistia era uma Madre médica, o motivo pelo qual os 9 anos de idade, num belo dia após termos saído do hospital da Missão, eu falei com a minha mãe que queria ser como aquela senhora que cuida dos doentes, e ai nasceu a minha paixão pelo cuidado dos doentes e da vida religiosa”, avança.

"Comecei com os estudos primários em 1973, na Escola do Cambiote, que era uma casa de um português, que agora está muito bonita e ampliada a escola, e tive de interromper a formação académica aos 10 anos, isto é, com a 3ª classe por conta da guerra que assolava o Sul do país, fomos forçados a abandonar o bairro da Correa e recuar para o São José, onde concluiu até a 4ª classe na Escola 142”, sublinha a Madre.

 Nesta altura, teve de ir ao académico, onde concluiu a 5ª e 6ª classes, depois foi ao liceu onde fez a 7ª e 8º classes aos 15 anos, teve de ser encaminhada ao Puniv onde estudou os dois anos de Ciências Biológicas, depois da formação do Puniv fez encaminhamento tendo escolhido os cursos de Medicina e Biologia, em 1985, os nomes dos seleccionados foram publicados no Jornal de Angola e o da Irmã Ana fazia parte para o curso de Medicina na Universidade Agostinho Neto (UAN).

Em 1985, matriculou-se em Medicina, mas foi forçada a anular o primeiro ano para seguir o chamamento à vida religiosa, em 1986 foi a Luanda onde fez dois anos no curso noviciado e em 15 de Outubro de 1988 professou.

Quatro anos depois, isto em 1989, volta para o Huambo por ordens da Obediência para rebuscar a carreira, retomando o primeiro ano de Medicina, e em 1991 no terceiro ano o núcleo da UAN no Huambo foi fechado pelas diversas dificuldades que os professores enfrentavam e pelo ressurgimento da guerra, como alternativa a congregação deu obediência para Luanda no São Paulo onde terminou a carreira em 1996.

Por conta de uma bolsa e estudos atribuídos pela congregação, a irmã Ana Maria Samuel foi ao Reino de Espanha, com a intenção de fazer Ginecologia, mas na altura de escolher a especialidade teve de trocar para Medicina Familiar, por não haver vagas na especialidade de Finecologia. Antes da sua partida para aquele país europeu, em Março de 2001, trabalhou durante três anos no Hospital Provincial do Bié na área da Pediatria.

Após o término da formação, em 2007 regressa ao país, à província do Bié, propriamente no município do Andulo, na Missão Católica de Chicumbi, onde exerce as funções de directora do Hospital Missionário Santa Ana até então.

Hoje, Irmã Ana Maria Samuel não tem dúvida que fez a escolha certa para a sua carreira profissional. Para si, ser médica familiar foi a melhor opção, e sente o benefício do seu trabalho junto da população rural com quem diariamente interage, com bastante zelo e dedicação, partindo sempre pelo amor ao próximo.

Os pacientes vêm de várias zonas, pela atenção e cuidados especiais que a irmã Ana presta a estes levam como referência e pelo excelente atendimento prestado pelos profissionais do hospital.

 "Aqui vêm pacientes de todo o lado, da própria sede do Adulo, Nharêa, até do Mungo, município do Huambo, e do Mussende, município do Cuanza- Sul. Quando dão os dados eles dizem que foram orientados a virem directamente ao nosso hospital”, destaca e acrescenta, "Os casos que mais encaminhamos são os de anemia, isto é, na Hemoterapia do Andulo e as cirurgias para o Cuito”, por falta de meios e especialistas para acudir estas ocorrências.

A irmã Ana Maria Samuel, disse que muitas pessoas podem encontrar um médico perto de onde moram, mas para milhares que vivem em comunidades rurais, o atendimento médico está a horas de distância, destacou a médica no final de um longo dia de consulta. A madre Ana Maria Samuel segue a vida a ajudar os mais necessitados no Hospital Missionário de Chicumbi. Segue a vocação de missionária e agora com foco de ajudar os doentes.

"Eu agradeço a Deus por esta possibilidade, porque não sou eu que fiz, mas é Deus que me colocou lá. Sou um grão de areia no meio deste grande deserto, explicou a Irmã”.

Angolana já foi homenageada pelo Papa

A irmã Ana Maria Samuel, da Missão Católica de Chicumbi, município de Andulo, recebeu em 2013 um diploma de mérito assinado pelo Papa Francisco,  pelos seus 25 anos de vida religiosa.

O Papa escreveu na altura que "concede de coração a desejada bênção apostólica por ocasião dos 25 anos de Ana Maria Samuel de vida consagrada invocada à abundância de via e protecção condigna à virgem Maria”.

Por este reconhecimento, a irmã Ana Maria Samuel não escondeu a sua alegria pela  comemoração das bodas de prata e agradeceu a todos pelo reconhecimento dos seus feitos durante os anos dedicados ao serviço religioso.

"Não posso ser ingrata e agradeço, primeiro, ao Criador, por ter proporcionado o dom de trabalhar no serviço religioso”, destacou a madre.

A Católica reconheceu o papel desempenhado pela sua mãe para que fosse hoje uma mulher que dedica a vida ao trabalho religioso. Este ano, ela completa 36 anos de trabalho religioso.

Dificuldades do Hospital

A médica familiar disse que uma das granes dificuldades com que o hospital se depara é a insuficiência de profissionais, e que na sua idade e categoria devia tratar somente os casos mais difíceis.

A irmã Ana faz consultas, passa receitas, orienta e dá medicamento aos pacientes, por não confiar muito na farmácia, por várias situações que a profissão a ensinou, então trata de se certificar que o paciente levou a medicação completa e ainda assim atende as enfermidades mais complicadas da sua especialidade.

"Eu sou médica-chefe de serviço, pela minha categoria, que é do último escalão da minha carreira, seria só médica de referência para casos críticos, que fazem com que se estude um pouco mais, e não atender os casos de enfermagem, como uma dor de cabeça, mas até isso faço pela falta de técnicos”, queixou-se.

A irmã Ana destacou que se sente realizada, por prestar serviços de saúde às pessoas desfavorecidas, e por ter assumido as suas grandes paixões, ter-se tornado madre e médica, justificando que está destinada a servir.

Em gesto de conclusão, a Irmã Ana apelou às mulheres a descobrirem a sua vocação, para sentirem o prazer da vida, trabalhando para o bem do próximo, principalmente nas profissões de atendimento ao pessoal, que deve ser feito com muito amor e empatia, "o chamado à vida religiosa ou a escolha da profissão não deve ser feita por imposição, mas com a descoberta da nossa vocação, disse.

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