Política

Amílcar Cabral considerado homem de ideais intemporais

Edna Dala

Jornalista

O ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República destacou terça-feira, em Luanda, que Amílcar Cabral não foi apenas um homem de causas, mas sim um “homem de causas nobres e certas”, cujos ideais são intemporais.

13/03/2024  Última atualização 08H45
Chefe da Casa Civil do Presidente da República prestigiou o colóquio internacional na Academia Diplomática Venâncio de Moura © Fotografia por: Arsénio Bravo| Edições Novembro
Segundo Adão de Almeida, o pai das independências da Guiné-Bissau e Cabo Verde foi daqueles homens que, sabendo interpretar os anseios dos seus povos, entregou a sua vida a favor de causas colectivas e de objectivos essenciais e fundacionais da existência humana, com realce para a liberdade para ser, o direito de escolher e o de não se submeter a outro ser humano.

Ao discursar, em representação do Presidente João Lourenço, na abertura do Colóquio Internacional por ocasião do centenário de Amílcar Cabral, que se assinala a 12 de Setembro deste ano, o ministro de Estado sublinhou que Amílcar Cabral encarou, desde cedo, a luta contra a colonização como uma luta de vários povos, que requeria plataformas de concertação permanentes.

Com este espírito, numa espécie de diplomacia da libertação dos povos, participou de reuniões de grupos antifascistas e frequentou a Casa dos Estudantes do Império e, posteriormente, o Movimento Anticolonial, com Agostinho Neto, Mário Pinto de Andrade, Lúcio Lara, Marcelino dos Santos, Pedro Pires e tantos outros, onde fomentaram a acção política anticolonial, lembrou Adão de Almeida, para quem a coincidência de objectivos, ideais e de causas ligou Amílcar Cabral a Angola.

"Amílcar Cabral conheceu Angola, conheceu os angolanos e partilhou as nossas causas. Fez da nossa luta, sua luta também, assim como o fez com Moçambique e com os moçambicanos”, frisou.

Aos presentes, o ministro de Estado lembrou que a identidade de ideais entre Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné-Bissau levou Amílcar Cabral, Agostinho Neto e Marcelino dos Santos a uma audiência no Vaticano, em Roma, com o Papa Paulo VI, em 1970, evento diplomático marcante da história das lutas de libertação contra a colonização fascista portuguesa.

Dignificação do Homem é desafio contínuo

Para o ministro de Estado e Chefe da Casa Civil do Presidente da República, a força dos ideais é intemporal e se auto-renova de geração em geração. "Por isso, homens da estatura de Amílcar Cabral são intemporais e os seus ideais foram úteis ontem e são necessários hoje”, ressaltou.

Adão de Almeida considera que, apesar de nos dias de hoje os desafios serem diferentes, a razão de ser continua a mesma: a dignificação do Homem. De resto, este é um desafio contínuo do nosso tempo”, disse. "Assim como inspirou Amílcar Cabral e seus companheiros para a luta pela liberdade e pela dignificação dos povos africanos, deve inspirar-nos hoje na luta pelo bem-estar, pelo desenvolvimento e pela construção de Estados capazes de proporcionar iguais oportunidades para todos”, defendeu.

Sobre o Colóquio, no qual estiveram a viúva e uma das filhas de Amílcar Cabral, o ministro de Estado disse ser uma forma de exaltar o centenário deste pan-africanista, mas também um chamamento à reflexão sobre os desafios dos tempos actuais.

"Hoje, o desafio não é a colonização tradicional, mas as várias formas de neocolonização. O desafio é como fazer da globalização uma realidade positiva e não uma desistência do nacionalismo africano, particularmente num momento em que a ordem económica mundial é ameaçada por movimentos nacionalistas extremistas e xenófobos”, observou.

O desafio de hoje, segundo ainda Adão de Almeida, é a transformação estrutural da nossa economia para que sobreviva aos choques externos, naturais em contextos de interdependência entre povos, economias e culturas.

"Só uma economia forte e estruturalmente diversificada é capaz de gerar empregos e pagar bons salários”, afirmou o governante, para quem a luta também passa pela formação de uma sociedade livre e de todos, que respeita cada um e salvaguarda o bem-comum, onde cada um encontra o seu espaço para realizar os seus objectivos e juntos fazermos a nossa prosperidade colectiva. "Ao mesmo tempo que celebramos o centenário de Amílcar Cabral e exaltamos a sua vida e obra, busquemos inspiração na sua geração e nos ideais para vencermos os desafios do presente”, exortou.

 
Ministro das Relações Exteriores realça liderança de Cabral

Téte António fala em pan-africanista de elevada estatura

O ministro das Relações Exteriores, instituição que promoveu a realização do colóquio, esclareceu que o evento teve como objectivo celebrar a vida de um dos mais destacados intelectuais dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e um "pan-africanista de elevada estatura”.

Téte António sustentou que se deve celebrar a vida porque o percurso libertador singular de Amílcar Cabral – cuja bravura e estoicismo legaram a emancipação dos povos de Cabo Verde e Guiné-Bissau – o tornaram imortal.

"Num ano em que se assinala os 50 anos da Revolução dos Cravos, a 25 de Abril, acontecimento intrinsecamente ligado à pressão militar, política e diplomática dos combatentes das antigas colónias portuguesas em África, reunimo-nos para lembrar o percurso da curta, mas marcante vida do companheiro da Casa dos Estudantes do Império, do engenheiro agrónomo da Companhia Agrícola do Amboim (Gabela), do companheiro do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, de Eduardo Mondlane, Marcelino dos Santos, Lúcio Lara, Mário Pinto de Andrade, Samora Machel e tantos outros, bem como na fundação da CONCP (Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas e das reuniões do Comité de Descolonização, em Dar-Es-Salam”, referiu.

O chefe da diplomacia angolana fez, igualmente, alusão à audiência que o Papa Paulo VI concedeu a Agostinho Neto, Amílcar Cabral e Marcelino dos Santos, a 1 de Julho de 1970, realizada devido à coesão de pensamento e de acção política daqueles nacionalistas. "Este marco tingiu o império com o manto da vergonha que, em resposta, causou o azedar das relações entre Portugal e o Vaticano”, observou.

O colóquio internacional contou com a participação de várias personalidades políticas, líderes religiosos, académicos e o corpo diplomático acreditado em Angola, com realce para representantes das embaixadas de Cabo Verde e Guiné-Bissau em Angola.

Téte António concluiu que o evento foi "memorável e de elevado simbolismo”, que reafirma e cimenta a irmandade dos PALOP, forjada pela história comum de colonização, de luta e da vitória sobre a opressão.

 O defensor da africanização do Marxismo

O historiador Cornélio Calei, um dos prelectores do colóquio, disse que a ideia de africanização do Marxismo é de Amílcar Cabral, e por ser muito profunda pode contribuir e servir de bússola orientadora de como "devemos marchar nos dias de hoje”.

Na curta abordagem, Cornélio Calei esclarece que o negro, apesar de ser africano, precisava ser africanizado”.

Amílcar Cabral, o pai das independências da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, brutalmente assassinado em Janeiro de 1973, em Conacri, República da Guiné, revelou o historiador angolano, tinha identidade dupla, nasceu em Bissau, mas é filho de pai cabo-verdiano e mãe guineense com descendência também de Cabo Verde.

Fez os estudos secundários em Cabo Verde e na Guiné-Bissau e o ensino superior em Coimbra, Portugal. Quando regressou, criou uma associação desportiva e cultural, a génese do futuro PAIGC, tendo sido mais tarde deportado para Angola por esta razão.

Cornélio Calei revelou que este processo não foi uma transferência, mas sim quase deportação para Angola, onde se envolveu com o renascimento dos angolanos, que começou exactamente com o manifesto escrito na clandestinidade, um pouco antes da Conferência de Bandung, em 1955, a qual seguiu atentamente.

O historiador afirmou que Cabral também esteve na génese da criação do MPLA, em 1956. Este movimento, realça, surge com um documento escrito na clandestinidade por vários intelectuais, onde Cabral terá igualmente participado. "Ele esteve muitas vezes em Angola e conviveu com os dirigentes angolanos na clandestinidade”, disse.

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