Política

Angola demonstra maturidade e progresso desde o 4 de Abril

Pereira Santana

Jornalista

O antigo político, que foi ministro da Comunicação Social e embaixador, com uma vivência em vários países da América, Europa e da África, afirma que “não podemos comparar o que era o país naquela altura e o país que temos hoje"

04/04/2024  Última atualização 14H13
Antigo político, que foi ministro da Comunicação Social e embaixador, Nacionalista Hendrick Val Neto © Fotografia por: Edições Novembro
Angola celebra 22 anos da conquista da paz efectiva, um marco histórico de progresso e estabilidade. Com o calar das armas, o país passou a trilhar o caminho do crescimento económico, a promoção da igualdade social e a construção de um futuro próspero para todos os angolanos.

Até à assinatura dos acordos de paz a 4 de Abril de 2002, Angola experimentou alguns processos de negociação, desde Alvor, Gbadolite, Nova Iorque, Bicesse, protocolos de Lusaka e do Luena. Vários foram os intervenientes nestes processos e o Jornal de Angola foi ao encontro de um deles, Hendrick Val Neto, nacionalista que no princípio dos anos 1960, ainda muito jovem, se entregou à luta contra o regime colonialista português.

Hendrick Val Neto esteve presente em Janeiro de 1975, no encontro de Alvor, em Portugal, onde foi assinado o acordo entre o governo português e os três principais movimentos de Libertação de Angola. Na altura, membro da FNLA, integrou o governo de transição como secretário para a Informação.

Durante uma conversa descontraída na sua residência no bairro Talatona, em Luanda, o nosso entrevistado começou por dizer que o 4 de Abril "não é e não deve ser considerado como uma simples data”, porque ele marca o fim de um longo tempo de uma "luta interna fratricida entre irmãos”, e porque foi também a partir desta data que se recomeçou "efectivamente a reconstrução do país”.

O antigo político, que em princípios dos anos 1990 deixou a FNLA para militar no MPLA, descreve os acontecimentos do 4 de Abril como "uma grande demonstração de maturidade” dos angolanos que, depois de muito tempo de uma guerra civil, chegaram à conclusão de que já não havia razões para a continuidade da divisão e sim pensar nas bases para a construção em comum do edifício nacional.

"Isto é extremamente importante”, disse Hendrick Val Neto recordando que os angolanos buscaram a reconciliação "sem que tivessem sido apontados vencedores e vencidos”, sublinhou.

Hendrick Val Neto sublinhou que no dia 4 de Abril de 2002, os angolanos começaram a pensar num novo país, no desenvolvimento. Quanto à luta interna, diz que "pode e deve existir”, mas ela deve ser de "opiniões, diferenças sobre metodologias, a na forma de como dirigir a Nação, jamais com guerras sangrentas que podem aprofundar as divisões entre os compatriotas”.

Em sua opinião é importante também que se reconheça o empenho dos "dirigentes que estiveram à frente deste processo”, cujo desfecho levou ao fim da guerra em Angola e à consolidação de uma paz efectiva e da reconciliação nacional.

"Isto mostrou o nível de maturidade que a própria guerra deu aos angolanos. A guerra veio também cristalizar a noção de nacionalidade. Chegamos à conclusão que é entre compatriotas que estavamos a lutar, uma luta inútil, quando podemos nos unir para construir a nossa Nação”, disse.

Segundo Hendrick Val Neto, os acontecimentos que ocorreram naquela quinta-feira, da primeira semana, do mês de Abril de 2002, mostraram também que houve "uma grande compreensão de todos os intervenientes nesse momento histórico”, por isso, "é algo que devemos guardar e relembrar de forma permanente”, sublinhou.

Entre os angolanos, disse em seguida, deve estar sempre presente o 4 de Abril, como "o espírito de reconciliação, o espírito de amor, o espírito de cooperação, porque só estes factores unidos é que podemos construir o nosso país. O país não pode ser construído com divisões. Pode haver debates, mas não combates”, enfatizou o político, nascido na província do Cuanza-Sul, em Novembro de 1944.

Avanços com os Acordos de Paz

Sobre os avanços de Angola, depois do 4 de Abril, Hendrick Val Neto que foi ministro da Comunicação Social, entre 1993 e 2005, disse que o "país tem andado num sentido bastante positivo”. Considera "extremamente importante”, o facto de se manter a Paz, o que demonstra, de igual modo, "o nível de maturidade” dos angolanos, assim como proporcionar "mais oportunidades para o desenvolvimento”.

O antigo político que tem uma vivência em vários países da América, Europa e da África afirma que "não podemos comparar o que era o país naquela altura e o país que temos hoje”. Val Neto disse que "apesar de todos os obstáculos que temos encontrado no processo de desenvolvimento, que é um processo longo, não podemos pensar que as coisas mudam com um simples toque, passamos da miséria à riqueza, ou uma mudança que nos leve de Angola aos Estados Unidos ou a França, não!”

Segundo ele, até os EUA que tem mais de 240 anos de Independência, assim como o continente europeu levaram tempo para se estabilizarem "e nós que temos apenas 50, e destes 50, 20 anos foram praticamente de guerra”. Portanto considera que "o processo angolano está bem”.

Hendrick Val Neto que foi também embaixador de Angola no Egipto, no período de 2006 a 2011, referiu que o processo de afirmação do país "é longo e com várias etapas”. Para ele, a luta pela liberdade e Independência começou há 500 anos, com "agressão, ocupação” e uma opressão que durou séculos, "diante de um esforço titânico conseguimos nos libertar do colonialismo”. disse.

Na óptica do nosso entrevistado, este processo vai continuar. "Não podemos pensar que vai haver um sistema que vai surgir e transformar Angola num paraíso, e esse paraíso é eterno, não será assim, não foi assim em nenhuma parte do mundo e não será assim também em Angola”, sublinhou.

Val Neto adiantou que neste processo de desenvolvimento do país não devemos só acompanhar, mas devemos também participar. "Temos de procurar contribuir para que o processo possa continuar de uma forma positiva. O 4 de Abril vem dizer-nos que deve haver colaboração estreita entre homens, organizações e instituições, devemos todos trabalhar para que o processo de desenvolvimento do nosso país possa continuar”.

Hendrick Val Neto, que é autor do livro "Fragmento: pedaços de Vidas em Prosa”, lançado em 2018, alerta que para no processo de desenvolvimento de Angola "vão haver soluções mais inteligentes, soluções menos inteligentes, vai haver erros, mas fazem parte do mesmo processo. Nós andamos a atribuir erros às pessoas. Vamos atribuir os erros ao sistema, do qual nós também fazemos parte”.

Perto dos seus 80 anos de idade, ele alerta ainda que "não podemos pensar que há uma parte de Angola que está a resolver o problema e outra parte que está contra a solução do problema. Não é verdade! Todos estamos a resolver o problema, com opiniões diferentes. É assim que as sociedades humanas funcionam. Vamos dar continuidade ao processo. Há imensos avanços, recuos também imensos. O que é normal”, disse.

Como despertar os jovens para o desenvolvimento do país

A participação dos jovens no processo de desenvolvimento de Angola é fundamental. Por essa razão, Hendrick Val Neto diz ser "crucial que as instituições competentes se dediquem ao tema da juventude, especialmente à sua orientação, reconhecendo que tal responsabilidade não recai exclusivamente sobre as famílias, mas também sobre o Estado e as escolas”.

A definição de um código de conduta e regras de comportamento, amplamente divulgadas na sociedade, é, em sua opinião, fundamental para orientar "o tipo de cidadão angolano que almejamos ser”.

Neste contexto, diz ser essencial estabelecer padrões claros que identifiquem as necessidades específicas de jovens para o país, para "evitar rótulos arbitrários de bons e maus jovens”. Disse ainda que as instituições, famílias e igrejas devem desempenhar um papel activo na orientação da juventude, assegurando que os jovens compreendam e adoptem comportamentos adequados.

Hendrick Val Neto fez questão de destacar que a sociedade angolana emergiu de um passado colonial opressivo, impactando a formação de valores e identidades. Por isso, para garantir um futuro próspero, é fundamental informar os jovens sobre a importância de suas escolhas educacionais para a sociedade.

Além disso, sublinhou, a formação dos educadores desempenha um papel crucial no sucesso desse processo, destacando a necessidade de uma classe de educadores bem formados e informados.

O antigo diplomata afirmou que a juventude angolana é "forte e determinada, demonstra potencial em diversas áreas, quando devidamente orientada. Investir na educação e formação dos jovens e educadores é essencial para o desenvolvimento sustentável do país, permitindo que cada angolano brilhe em sua área de actuação”.

Recordar experiência de Alvor

Hendrick Val Neto militou até 1990, no movimento Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), esteve presente no encontro de Alvor, em Janeiro de 1975, onde, na altura as três forças nacionalistas discutiram com o governo português a libertação de Angola para a proclamação da sua independência.

Com o antigo secretário de Informação do governo de transição, quisemos viajar no tempo e ouvir o seu testemunho sobre Acordo de Alvor que foi, segundo ele, "o culminar da longa luta de libertação”. Val Neto disse ter sido a altura em que o povo angolano pôde "regozijar-se por ter conquistado o direito à autodeterminação e independência”, uma vez que "Portugal nunca quis aceitar isso ao longo dos anos, sendo um dos últimos países a reconhecer o princípio da descolonização”.

O nacionalista recordou que a resistência contra os portugueses durou 500 anos, e fomos os últimos a manifestar essa resistência. "Não podemos considerar-nos os únicos lutadores pela liberdade desde os anos 1960. Antes disso, milhões de indivíduos lutaram para que Angola pudesse ser livre”. Para ele, o processo de libertação de Angola, durou 500 anos, e não apenas 14 ou 15 anos. Houve a participação de Reis que foram presos e mortos, combatentes martirizados, por isso, é importante reconhecer essa história.

Para finalizar a nossa conversa, Hendrick Val Neto disse que o Acordo de Alvor representou a grande vitória desse esforço colectivo, com o reconhecimento de Portugal do "nosso direito à libertação e independência”. Foi uma ocasião de grande regozijo para todo o povo angolano, pois, naquela época, o mais importante para não era a política, mas sim a liberdade. "A Angola de hoje é fruto desse reconhecimento e esforço dos angolanos para que Portugal aceitasse o nosso direito”.

"Naquela época, o Acordo de Alvor foi motivo de grande celebração e euforia para nós”, afirmou.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Política