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Comuna de Mona Quimbundo investe na produção de cacusso

Adão Diogo | Saurimo

Localidade foi contemplada com uma Escola Técnica Agrária (ETA), um Centro de Investigação e 100 tanques aquícolas, 50 dos quais, com tilápia(cacusso)

06/02/2024  Última atualização 10H20
A fiscalização dos tanques é feita todos os dias, podendo observar-se o movimento dos peixes © Fotografia por: kamuanga Júlia | Edições Novembro

O silêncio habitual na vila de Mona Quimbundo é alterado pelo chiar de pneus das viaturas que deslizam sobre o novo asfalto na Estrada Nacional 230, como atletas galvanizados, a escassos metros da meta.

 O cenário no antigo posto da administração colonial, que precedeu à instalação definitiva da então sede do distrito da Lunda, actual cidade de Saurimo, transmite ao visitante a ideia de um ordenamento urbano meio confuso, com "meia dúzia" de infra-estruturas a assinalar as realizações possíveis.

Edifícios públicos, como a Esquadra da Polícia Nacional, a sede da Administração, uma escola de oito salas, centro médico e residências protocolares, formam a zona  nobre que partilha o espaço com construções rudimentares de cantinas e casas de particulares.

O administrador da comuna, que dista a mais de 50 quilómetros da cidade de Saurimo, sede da província da Lunda-Sul, nota que, das estruturas herdadas do tempo colonial, sobraram apenas vestígios do antigo posto médico, lojas e escola primária de apenas uma sala de aula.

A  pista do antigo aeródromo, com tufos de capim e arbustos em alguns pontos, desafia o tempo. O silo para a conservação de grãos, ao lado do antigo escritório, todos adstritos ao sector da Agricultura, estão reduzidos a escombros.

 
Residências às escuras

A estrada nacional reabilitada e, pela primeira vez, com acessos para estacionamento, ganhou notoriedade. É assunto do dia, nas conversas dos habitantes, inconformados, por outro lado, com o silêncio em torno dos candeeiros para a iluminação pública, fora de serviço há quatro anos, por falta de manutenção dos dispositivos fotovoltaicos acoplados.

As autoridades locais reagem com silêncio às insistentes reclamações dos moradores que, há anos, deixaram de beneficiar de energia eléctrica nas residências, devido a uma avaria no único gerador de 80 KVA. "Dormem dolorosamente às escuras", lamenta o administrador, que mantém as expectativas quanto à solução do problema pelas estruturas competentes. 

A partir de um sistema de furos artesianos e um tanque reservatório aéreo com capacidade de 4000 litros, a água chega à população através de chafarizes. O abastecimento faseado resulta na formação de uma fila, por ordem de chegada.

 
Exclusão da rota de autocarros

A "exclusão" no mapa de rotas de autocarros geridos por agências privadas complica a vida da população. Por uma viagem de Mona Quimbundo a Saurimo, os taxistas cobram, no mínimo, mil kwanzas por passageiro.

O gestor da comuna domina a situação, elogia, com sentimento de profunda gratidão, o gesto de solidariedade que a empreiteira OMATAPALO demonstrou, ao ajudar as pessoas durante a reabilitação do último troço de 54 quilómetros da referida estrada. Com uma aparência de descontracção, o professor José Macedo controla, à distância, o movimento de viaturas enquanto "implora" por uma oportunidade, para viajar à Samussanda, onde trabalha há dois anos. Reconhece que o estado do percurso de 40 quilómetros entre a sede comunal e a povoação desencoraja a ida regular de carrinhas, em regra alugadas por camponeses, para transportar os produtos.

A jornada diária do "mestre" que vive numa casa rudimentar e com uma dieta à base de funge  de bombó, começa com a materialização dos planos de aula para 167 alunos matriculados, da iniciação à quarta classe. "Sou o único professor na comunidade, que me trata com muito carinho”, reconheceu. O professor lamenta o sacrifício que os moradores consentem para obter água a partir de um rio, que fica a cerca  de três quilómetros, devido à avaria, "há muitos  anos", do antigo sistema de  abastecimento.

 
Investimentos

Os investimentos que o Estado realizou dotaram o sector da Educação com mais de 100 salas de aula para um universo de 7.850 alunos distribuídos em 12 escolas, erguidas em várias localidades da comuna.

Os conhecimentos em Teologia, alternados com respigos de humor, despontam na descrição dos factos. Rafael Mutximata Primeiro sublinha a vulgarização da agricultura no seio dos mais de 18.800 habitantes. Do cultivo habitualmente feito à mão, as famílias colhem, em grande escala, a mandioca. A batata doce, feijão frade(macunde), a ginguba, o sorgo (massambala) tonificam o verde nas lavras, em quantidade, que perfilam atrás do ananás.

Com um histórico de sucesso no tempo colonial, o cultivo do arroz está entre as prioridades. A multiplicação de sementes em fase experimental decorre na segunda fase, numa extensão de 27 hectares. O administrador Rafael Mutximata Primeiro acredita no sucesso, com base nos indicadores da época passada, aliadas à existência de capacidade humana e vontade.

Os mentores do projecto acompanham com atenção o comportamento das variedades durante o ciclo vegetativo. A ideia é uniformizar parâmetros de actuação para que a vulgarização do cultivo, pelas famílias camponesas, resulte em colheitas promissoras.

 
Escola agrária

Mona Quimbundo é terra abençoada. Foi contemplada com uma Escola Técnica Agrária (ETA), um Centro de Investigação e 100 tanques aquícolas, 50 dos quais, povoados por tilápia(cacusso). Possui um clima temperado húmido e várias chanas extensas.

A fiscalização dos tanques é feita todos os dias. Alegria Punga interpreta o salpicar da água, provocado pelos movimentos agitados dos peixes, como insistentes "pedidos de ração", há muito excluída da dieta alimentar, limitada apenas às condições que a natureza disponibilizou nos tanques.

O alinhamento dos tanques seguiu critérios rigorosos. Cada fila comporta peixes numa determinada fase de crescimento. Punga garante que as capturas obedecem a um plano superiormente aprovado, sobretudo nas vésperas de feiras na cidade de Saurimo. Localmente, os habitantes não compram o peixe, porque consideram elevado o preço de 2500 kwanzas por quilograma.

 
Escola agrária

Sentados sobre o tronco de uma árvore caída no pátio do complexo escolar "1 de Junho", os futuros agrónomos Arlindo Predador, Elias Alfredo, Evaristo Tony, Waldemar Bruno Wilson Xadraque e Quintas Máquina, valorizam o facto do Estado criar um internato e condições para a formação técnico-profissional de jovens.

Com sistemas autónomos de fornecimento de energia e água, a escola agrária dispõe, também, de tractor, laboratórios e outros serviços. Tudo isso visa preparar  os estudantes com bagagem técnica e científica para as exigências que a profissão impõe.

 
Legado colonial

A tradição no cultivo de arroz data do tempo colonial. Rafael Mutximata Primeiro garantiu que antigos agricultores  "estão dispostos a passar a experiência adquirida” com os colonos.

O administrador comunal considera  o sector  agropecuário  uma bandeira "meio desfraldada", porque as famílias realizam o cultivo manual, usando técnicas tradicionais. Por causa dos hábitos alimentares, a mandioca predomina nos campos cultivados. A sua transformação em bombó resulta em prejuízos, por dificuldades de escoamento, devido ao mau estado das vias de acesso para os mercados da sede da província.

Rafael Mutximata Primeiro sublinha que as dificuldades no transporte dos produtos entristece os produtores, que chegam a  acumular centenas de sacos de bombó, como se constatou nas localidades de Maquinda e Quiquili.

As poucas viaturas que aparecem nas zonas de produção cobram preços altos e levam os produtores a desistir, devido à magra margem de lucro.

O administrador defendeu a elaboração de uma tabela de preços que tenha como base o peso, a distância e as condições das vias, para facilitar os produtores.

 
Abacaxi ocupa lugar de destaque

No conjunto de outros frutos, o abacaxi ocupa um lugar de destaque, com  dezenas de hectares plantados nas fazendas Moreira, Txipepe, Catambilia e Ifindefinde, onde crescem outras culturas, além da criação de gado bovino, caprino e aves rústicas.

Apesar do cordão de segurança aconselhar uma circulação num raio de 50 metros, por suspeitas de ainda existirem minas implantadas durante o conflito armado, usando caminhos conhecidos e confiando na protecção divina, os habitantes realizam as suas actividades, por vezes, percorrendo longas distâncias, em zonas suspeitas de minas, num clima de descontração.


 Zona turística

A localização estratégica criada pela Estrada Nacional e a proximidade à sede da província transformam o rio Luvo, a escasso um quilómetro da vila, num ponto turístico. Alguns camionistas estacionam no local para  tomarem banho e outros contratam jovens para  lavarem as viaturas.

O administrador de Mona Quimbundo ressalta, no domínio turístico, a existência de  uma fenda profunda, identificada na era colonial na  localidade de Mwatxicuata, a 60 quilómetros da sede. O mapa turístico abarca, igualmente, uma queda de água, por sinal a maior na província, e um ponto de convergência de dois rios que funciona como "paraíso” para muitos animais.   

Resguardado por uma estrutura de betão, usada como barreira para limitar o acesso de viaturas, o estudante Anjo Marco, 16 anos, diz que o rio é a sua "praia habitual", no período da tarde. Depois do banho diário, regressa à casa carregando nas mãos um bidão de água para as lides domésticas.

Apesar de frequentar apenas a 5ª classe, aos 15 anos, Ipanga Manuel sonha em ser professor. A sua jornada diária é repartida entre a lavra, a sala de aula e, ocasionalmente, o rio, onde realiza a pesca com a ajuda de um anzol, na companhia dos irmãos Domingos Manucho, Cassinda Eduardo e do amigo Patrício Pedro.

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