Sociedade

Dia da obesidade: Problema atinge cerca de mil milhões de pessoas no mundo

Alexa Sonhi

Jornalista

Especialista em Saúde Pública disse que o país não dispõe de estatísticas oficiais sobre a obesidade, por não ser uma doença de notificação obrigatória

04/03/2024  Última atualização 10H26
Excesso de peso pode ter causas genéticas, hormonais, psicológicas (stress, depressão) e o consumo excessivo de alimentos com altos valores calóricos © Fotografia por: DR

Desde criança que Neusa Lanvo(nome fictício) sofre com o excesso de peso, que por sinal, é um problema geracional. Porque, dois dos  irmãos dela, também, enfrentam a mesma situação. Por este motivo, na rua onde moram, no Distrito Urbano da Samba, os três são chamados de fat family, nome do grupo vocal brasileiro, cujos integrantes têm excesso de peso.

Neusa conta que sempre foi tradição de família não deixar nada no prato, mesmo que estivesse com muita comida e, ao fim, tinham sempre sobremesas doces à disposição de todos.

E como não tinham o  hábito de praticar alguma actividade física, todos de casa apresentavam-se com excesso de peso. Mas, isso não os incomodava porque era sinal de fartura, boa vida. E, como resultado, à medida que Neusa Lanvo e os dois irmãos cresciam, começavam a sofrer bullying, na escola, vizinhança, no seio dos amigos e até em ambientes familiares.

 

Na adolescência

Já na adolescência, por conta da gordura, Neusa cansava-se com muita facilidade, tinha dificuldades em encontrar roupas que lhe sentassem bem no corpo, sentia vergonha de sair com as amigas, porque não ficava à vontade no meio delas.

Os rapazes da escola e da vizinhança não lhe davam atenção e, algumas vezes, se riam dela dizendo que dificilmente arranjaria namorado e sem interesse no dinheiro dos pais dela por conta das banhas”, recorda com semblante triste.

"Esta situação deixava-me muito deprimida, a ponto de não querer mais sair de casa. Negava-me em ir à faculdade e comecei a comer muito mais do que o normal. Nessa fase, tinha 18 ou 19 anos e já pesava 135 quilos, com 1,70 metro altura. Era horrível olhar-me no espelho”, lembra.

 
Ajuda de especialistas

Preocupados, os pais, que também estavam muito acima do peso, procuraram ajuda de um psicólogo, e este, por sua vez, depois de algumas consultas, aconselhou a família a procurar ajuda de um endocrinologista e um nutricionista para que todos pudessem perder peso de forma saudável e em equipa.

"Depois de alguns exames, o médico disse-nos que corríamos um alto risco de desenvolver diabetes. Então, a ideia de tomar insulina pelo resto da vida assustou os meus pais e descobrimos ainda que tínhamos o colesterol alto, que lhes obrigava a fazer medicação regularmente.

Ao sair do hospital, a família de Neusa Lanvo mudou drasticamente de hábitos e, com a ajuda de um preparador físico, desenvolveram um programa regular de exercícios, que incluía 45 minutos de caminhada, cinco vezes por semana, e treinos aeróbicos.

Para ajudar no emagrecimento, Neusa e os familiares eliminaram os petiscos, batatas fritas, certos pratos de alto teor calórico e as sobremesas doces para comer muita salada, legumes e variedade de fruta.

Em relação à mesa que ficava todo o dia posta com comida, em sinal de fartura, hoje só colocam comida apenas na hora das refeições, para se evitar comer muito e sem necessidade.

Actualmente com 46 anos de idade, Neusa pesa 80 quilos, mas pretende perder mais, porque quer chegar aos 70 quilos, tendo em conta a altura de 1,70. "Não preciso mais de remédio para manter o colesterol sob controlo, tenho mais energia e, inclusive, os meus irmãos e os meus pais também já saíram do grupo de obesos”,  contou, a sorrir.


O que é a obesidade?

A médica endocrinologista Francisca da Silva define-a como um acumúlo do tecido adiposo (gordura) no organismo, tornando-se, assim, numa doença crónica, recidivante e multifactorial.

Francisca da Silva disse que, geralmente, a obesidade é causada pelo sedentarismo e consumo exagerado de alimentos ricos em gordura e em açúcar. Além de ser classificada de acordo com o peso, a obesidade também varia de acordo com a localização e distribuição da gordura pelo corpo.

Daí existirem três tipos de obesidade,  a abdominal, periférica e a homogenia. A abdominal ocorre com a  concentração de gordura no abdómen e na região da cintura. Esse tipo de obesidade está associado ao risco de adquirir doenças cardiovasculares como colesterol alto, doenças do coração, infarto, diabetes, inflamações e trombose.

Já a obesidade periférica, disse, é mais comum em mulheres. A gordura localiza-se na região das coxas, quadris e nádegas. Esse tipo  está associado à insuficiência venosa, varizes e osteoartrite nos joelhos, além de aumentar o risco de doenças cardíacas e diabetes.

Em relação à obesidade homogênea, a médica explicou que não há uma predominância da gordura numa área localizada, porque o excesso de peso está distribuído pelo corpo todo. Apesar disso, prosseguiu, também é perigosa porque, ao se descuidar, haverá um grande impacto na aparência física.

 
Causas da doença

Questionada se existe uma tabela para se determinar a obesidade, a endocrinologista respondeu afirmativamente. Existe o clássico método de Índice de Massa Corporal (IMC), que calcula o peso em relação à altura e acha-se o resultado.

Exemplificando,  considera-se um peso normal, caso a pessoa tenha 18.0 a 24,9 quilogramas por metros quadrados (Kg/m2)

Já é considerado sobrepeso se tiver 25.0 a 29,9 kg/m2

Obesidade do grau 1, se tiver 30.0 a 34.9 kg/m2;

Obesidade  do grau 2, se tiver 35.0 a 39.9 kg/m2;

Obesidade do grau 3 ou obesidade mórbida, se igual ou superior 40 kg/m2.

Francisca Silva frisou que a obesidade dá origem a várias doenças como diabetes, hipertensão arterial, colesterol elevado, enfarte, artrose dos ossos, doença renal aguda levando à insuficiência renal, Acidente Vascular Cerebral, (AVC) e apneia do sono.

 
Interferência na vida sexual

A médica sublinhou que a obesidade interfere significativamente na vida sexual do casal e na reprodução, porque as pessoas com peso acima da média têm muitas dificuldades de gerar filhos, principalmente as mulheres, além de originar indisposição e baixa autoestima.

 
Causas

A obesidade pode ocorrer em qualquer idade e  ter como causas questões genéticas, hormonais, psicológicas (como stress, depressão, ansiedade) sedentarismo e pelo consumo excessivo de alimentos com altos valores calóricos.

A especialista em Endocrinologia explicou que a obesidade tem como sinais a falta de  ar, dificuldades respiratórias, devido à pressão do peso abdominal sobre os pulmões, dores no corpo, sobretudo nas costas, pernas, joelhos e ombros, devido ao esforço que o corpo faz para suportar o peso.

"A obesidade também cria dificuldades ao caminhar, devido ao excesso de peso e descondicionamento do corpo, causa dermatites e infecções fúngicas, devido ao acúmulo de suor e sujeira nas dobras do corpo, manchas escuras na pele, principalmente pescoço, axilas e virilhas”, esclareceu.


Cerca de 10 por cento da população do país é obesa

Segundo o especialista em Saúde Pública Jeremiais Agostinho, cerca de 10 por cento da população angolana é obesa, sinal de que os níveis de obesidade são restringidos.

 Para Jeremiais Agostinho, estes números são de estudos independentes feitos por instituições, teses de doutoramento e por meio de alguns censos, porque, infelizmente, em Angola, não há estatísticas oficiais sobre a obesidade, por não ser uma doença de notificação obrigatória no que toca à saúde pública. 

O especialista em Saúde Pública explicou que, no país, o processo é inverso, maioritariamente, há mais indivíduos desnutridos do que obesos. "Daí que a nossa maior preocupação não é com a obesidade, mas, sim, com o nível de desnutrição acentuado que o país regista, tanto em crianças como em adultos”, sublinhou.

Segundo Jeremiais Agostinho, os poucos obesos que existem, no país, estão concentrados em zonas urbanas, devido ao estilo de vida agitado das grandes cidades.

 
Mil milhões de pessoas obesas no mundo

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de mil milhões de pessoas no mundo são obesas. Estimando, assim que uma em cada oito pessoas a nível global sofre deste problema, enquanto 43 por cento dos adultos estão com sobrepeso, de acordo com estudos realizados pela OMS em 2022. 

O estudo revela, ainda, que, em todo mundo, a obesidade entre adultos duplicou desde 1990 e quadruplicou em crianças e adolescentes com idades entre 5 e 19 anos, tornando-se. assim, num sério problema de saúde pública.

Por esta razão, na Assembleia Mundial da Saúde, realizada em 2022, os Estados-membros adoptaram o Plano de Aceleração da OMS para conter a obesidade até 2030. Actualmente, 31 governos lideram o caminho para conter a obesidade, mediante a implementação do referido plano.

As estratégias defendidas pela OMS para conter os índices de obesidade incluem acções para apoiar práticas alimentares saudáveis​​, desde o primeiro dia de vida, à promoção e apoio à amamentação, regulamentos sobre a publicidade de alimentos e bebidas para crianças.

 Outras acções que têm sido levadas a cabo estão relacionadas com as políticas de alimentação e nutrição escolar, regulação das vendas de produtos ricos em gorduras, açúcares e sal nas proximidades das escolas e a integração dos serviços de prevenção e gestão da obesidade nos cuidados primários de saúde.

O Dia Mundial da Obesidade foi instituído a 4 de Março de 2020, pela OMS. A data tem como finalidade disseminar conhecimentos, sensibilizar a população sobre riscos associados e combater o estigma social que envolve a doença.


Prevenção e tratamento

A nutricionista Lucira Guedes explicou que, ao se tratar a obesidade, deve-se começar com a mudança do estilo de vida, desde a alimentação, gestão do sono e do nível de stress. Só com estas mudanças a funcionarem, em seis meses a pessoa já perde cinco a 10 por cento do seu peso.

 Lucira Guedes acentuou que, para quem já é obeso, é preciso optar por reeducação alimentar, abraçando uma alimentação mais saudável, rica em fibra, reduzir os açúcares e sal, praticar uma actividade física como aeróbica e musculação.

No que toca à prevenção, a nutricionista aconselha que a obesidade deve ser prevenida desde a infância, adoptando hábitos alimentares saudáveis, que envolvam toda a família. "Deve-se incentivar as crianças a consumirem mais frutas, legumes, saladas devidamente preparadas para evitar outros problemas de saúde”, disse.

A especialista em nutrição realça que na mesma proporção, deve-se retirar os doces nos lanches da escola das crianças, evitar alimentos industrializados, consumir bastante água e sumos naturais, batata doce, mandioca, banana pão, carne fresca e peixe. 

Lucira Guedes adverte que as mudanças dos hábitos alimentares devem ser feitas de forma gradual e saudável, respeitando as medidas no prato e os intervalos das refeições.

"O recomendável é comer poucas proporções de três em três horas e evitar comer demasiado à noite, porque neste período a digestão é muito mais lenta”, aconselhou.


Preparador  Ambrósio Casal
Prática de exercícios físicos é a melhor forma de perder peso

O preparador físico Ambrósio Casal reconhece haver vários tratamentos que ajudam a ultrapassar a condição de obesidade, mas alerta que, muitos destes tratamentos são evasivos e não beneficiam a saúde de forma correcta.

Segundo Ambrósio Casal, muitos destes tratamentos não preparam as pessoas para o pós-tratamento, deixando-as facilmente propensa à condição anterior de obesidade.  Por isso, a melhor forma de perder peso e mantê-lo no nível certo, disse, é praticar exercícios físicos e ter uma alimentação equilibrada.

O preparador físico realça que, ao receber uma pessoa obesa e disposta a perder peso, primeiro deve ser feita uma avaliação psicotécnica para se obter as informações necessárias, a fim de entender com precisão a real necessidade que a pessoa obesa tem e aquilo que gostaria de alcançar como desenvolvimento físico.

Ambrósio Casal disse ser importante que o preparador físico saiba quais as verdadeiras dificuldades que a pessoa obesa tem no seu dia-a-dia, que lhe provocam sentimentos de impotência e, depois disso, criar estratégias de treino atractivas que gerem ligações entre a pessoa obesa e a prática de actividades físicas.

Na opinião do preparador físico, é de extrema importância que a pessoa obesa aceite e reconheça que precisa de ajuda para perder peso, mantê-lo no limite e depois respeitar o processo do treino, mesmo não sendo fácil. "Só com muita disciplina  e persistência é que os resultados serão visíveis”, sublinhou.  

Ambrósio Casal reafirmou que a melhor forma de perder peso, e de maneira saudável, é praticar exercícios físicos, porque promovem uma série de reações metabólicas responsáveis pela perda de peso.

Com a prática de actividade física, disse, o organismo utiliza a gordura armazenada no nosso corpo, servindo como fonte de energia na realização de  actividades.

"Mas, este processo só vai ser eficaz com o auxílio de um protocolo nutricional adequado. Desta forma, a pessoa obesa terá um emagrecimento saudável”, concluiu o preparador físico.

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