Sociedade

Hoje, o dia mundial da audição: Serviço de Audiologia atende mais de cinco mil pacientes por ano

Alexa Sonhi

Jornalista

Celebra-se, hoje, o dia mundial da audição, instituído pela OMS, com o objetivo de sensibilizar a população sobre a importância da audição e promover acções para a prevenção de perda auditiva e melhoria dos cuidados auditivos

03/03/2024  Última atualização 09H04
© Fotografia por: Rafael Tati | Edição Novembro

O serviço público de Audiologia, que funciona no hospital Josina Machel ( Maria Pia), em Luanda, desde 2015, regista em média, mais de cinco mil pacientes por ano.

Em entrevista ao Jornal de Angola, por ocasião do Dia Mundial da Audição, que se assinala hoje, a responsável do serviço de Audiologia clínica e Protetização do hospital Josina Machel ( Maria Pia), Lisianne Goumonal, disse que, por dia, este número equivale a 20 ou 30 pacientes atendidos em consultas externas.

 
Poucas crianças em consultas

De acordo com a audiologista, nestes números, há,  registo de poucas crianças,  dado que chama muito atenção, porque a base da pirâmide é adulta, quando tinha de ser o contrário, ter mais crianças do que adultos.

Lisianne Goumonal sublinha que este é um forte sinal de que os adultos, ao aparecerem em consultas com problemas de audição, já os carregam desde a infância. Mas como não há cultura de frequentarem os hospitais de forma rotineira, acrescentou, apenas aparecem na fase adulta.

Para a médica, nestes casos, pouco ou quase nada se pode fazer em termos de correcção natural, devendo recorrer ao uso de aparelhos auditivos.

"Mas se as crianças aparecem em consultas externas, vamos conseguir diagnosticar desde tenra idade, vai se tratar adequadamente, evitando assim que carreguem a doença até à fase adulta”, acentuou a audiologista.

Lisianne Goumonal adverte que o número de pacientes atendidos por dia nos serviços de Audiologia não reflecte a realidade do país, se for levado em conta a densidade populacional de Angola e o excesso de barulho a que a maioria da população é submetida diariamente.

A especialista explica que o serviço de Audiologia do Josina Machel ( Maria Pia), é o único a nível do sector público do país. Mas, apesar disso, a especialidade é pouco conhecida devido à falta de informação, tanto da população como de muitos profissionais de Saúde.

 
Definição

A especialista em Audiologia definiu a audição como sendo o mecanismo de captação de ondas de pressão do ar pela orelha. E este órgão, por sua vez, traduz os estímulos mecânicos em impulsos nervosos que são percebidos pelo cérebro como som.

A audiologista salienta que a orelha é o órgão responsável pela função auditiva e pelo equilíbrio estando divida em orelha externa, média e interna.

De acordo com a médica, a orelha externa é formada pelo pavilhão auricular e pelo meato acústico externo ou canal auditivo responsável pela captação do som e transmissão para a membrana timpânica.

Já a orelha média, disse, é formada pelo tímpano, que é constituído por três ossos – bigorna, martelo e estribo. Estes têm a função de transmitir as vibrações para a janela oval. E esta estrutura, ao vibrar, cria ondas de pressão no líquido presente no interior da cóclea.

"A orelha interna (ou labirinto), é formada pelos canais semicirculares, vestíbulo e cóclea, que são câmaras cheias de líquido. Os canais semicirculares também actuam no equilíbrio da audição”, explicou.

 
Audição normal

Segundo a médica, para que o som seja ouvido e processado, o mesmo depende da intensidade (ou nível de pressão sonora),bem como da frequência sonora percebida.

A especialista informou que a audição considerada normal deve ir até 20 decibéis(dB). Quando já passa deste valor, a pessoa começa a apresentar alguns sinais de perda auditiva.

Em relação à exposição ao ruído, a médica explicou que até 80 decibéis é o nível tolerável para não danificar a audição. Acima deste ruído, disse, já começa a lesionar o aparelho auditivo e, muitas vezes, a situação é irreversível, a chamada "perda de audição induzida por ruído.

"Por isso, é muito importante seguir à risca as recomendações dos cuidados auditivos, relacionados com ouso de equipamentos de protecção individual aos trabalhadores com exposição aos ruídos, porque, o excesso de barulho provoca a perda de audição”, acentuou.

 
Teste da orelhinha

A médica audiologista frisou que, para se celebrar a data, o serviço de Audiologia clínica e Protetização do Hospital Josina Machel ( Maria Pia), está a realizar, desde o dia 1 do corrente mês, uma campanha massiva de teste de "orelhinha” a todas as crianças recém-nascidas, para se descartar e tratar qualquer problema relacionado com a perda auditiva.

"Queremos trabalhar com as maternidades, pediatras, ginecologistas-obstetras, para que, desde as consultas pré-natais, informem às mães que existe um protocolo internacional, que tal como o teste do pezinho, também se deva realizar o teste da orelhinha para descartar qualquer doença auditiva.

Lisianne  Goumonal disse que o teste é feito aos recém-nascidos, não dói nada, não sangra, e em menos de cinco minutos, se obtém o resultado. No teste, coloca-se um microfone dentro da orelha da criança, e este, por sua vez, emite um som que passa pela orelha média, orelha interna e vai retornar para o microfone.

Caso haja alguma alteração da cadeia de som, o microfone detecta. Logo, esta criança terá de ser submetida a vários testes auditivos e o tratamento que se impõe.

Segundo a OMS, até aos seis meses de idade, todas as crianças devem estar diagnosticadas e protetizadas no que toca à audição.

 
Causa da perda de audição

A perda da audição pode ser genética (nascer com ela devido a uma má formação) ou adquirida por conta de doença, mau cuidado da orelha, medicação ou exposição aos ruídos e uso excessivo de auriculares, que entram em contacto directo com a orelha média.

 Sobre as doenças, a médica disse que infecções de ouvidos maltratados causam perda de audição. Em relação à medicação, a audiologista informa que existem mais de 200 medicações que causam problemas de audição como é o caso do quinino e furosemida, por exemplo.

 
Limpeza da orelha

A especialista alertou que a limpeza da orelha deve ser feita por um especialista em Audiologia ou Otorrinolaringologia, nunca por pessoas sem qualquer experiência na área.

A médica advertiu que, em casa, os pais devem ter muito cuidado, não se coloca nada dentro da orelha, remédio caseiro ou qualquer outra coisa sem a orientação de um especialista em Audiologia ou Otorrinolaringologia. 

"Está completamente errado o uso do cotonete para limpar a orelha por dentro. O cotonete foi feito para limpar o pavilhão auricular, que é a parte externa da orelha”, aconselhou.

A especialista em Audiologia disse que, dentro da orelha, limpa-se com toalha de banho usando o dedo indicador, porque a cera (o que as pessoas chamam de lixo), tem bactérias boas que servem para proteger o ouvido. "Mas, se retirarmos a cera, deixamos o ouvido sem protecção e ficamos susceptíveis a infecções”, disse.

A audiologista aclarou que, quando se tem cera dentro e usa-se o cotonete, corre-se o risco de empurrá-la para dentro e ela cola na membrana timpânica, que ao retirar pode furar esta membrana, causando assim sérias dificuldades auditivas.

"E para se resolver este problema, terá de ser feita uma cirurgia chamada timpanoplastia que, infelizmente, em Angola ainda não se faz. Muitos pacientes com estes problemas são encaminhados para a Junta Médica Nacional, a fim de realizarem a cirurgia no exterior do país”, esclareceu.

Lisianne Goumonal disse que, em média, são enviados para a Junta Nacional de Saúde, cinco pacientes por mês. O quadro já é muito preocupante, disse, considerando ser um sério problema de saúde pública.

Sobre as pessoas que produzem mais cera do que as outras a ponto de as incomodar, audiologista aconselha a procurarem o serviço de Audiologia, pelo menos, uma vez ao ano, para o especialista fazer a lavagem de forma correcta e não danificar a membrana timpânica.

 
Prevenção

A especialista em Audiologia explica que ouvir som muito alto e usar fones de ouvido frequentemente e com volume alto podem causar perda auditiva. A exposição a sons muito fortes, salientou, pode destruir as células ciliadas, localizadas na cóclea (orelha interna).

Essas pequenas lesões no ouvido, esclareceu, podem causar uma perda gradativa de audição que passa despercebida, mas pode levar à surdez permanente.

Por isso, alertou, para prevenir deve se evitar ouvir som muito alto, reduzir a frequência do uso de fones de ouvido, não introduzir objectos pontiagudos na orelha, para evitar lesões, usar protectores de ouvido quando estiver exposto a sons muito altos, como em shows.

Em caso de exposição excessiva a ruídos no trabalho, disse, deve-se usar equipamentos de protecção individual contra ruídos. Para as mulheres gravidas, a especialista aconselha a realizarem o exame pré-natal para se proteger contra sífilis, rubéola e toxoplasmose, que podem provocar problemas de audição ao bebé.

 
Necessidades do serviço

Lisianne  Goumonal informou que, no país, existem apenas dois especialistas em Audiologia, sendo ela, de nacionalidade brasileira e responsável do único serviço público de Audiologia de Angola, e um outro médico de nacionalidade portuguesa, que trabalha no sector privado.

Por isso, a médica apela às entidades competentes a prestarem mais atenção a esta especialidade porque a audição é um dos sentidos mais importantes da vida, pois, sem ela, a comunicação não é possível. "Uma pessoa com problemas auditivos está fora do mercado de trabalho e gera um gasto económico para o país”, disse.

O Dia Mundial da Audição foi instituído em 2007, pelo Escritório de Prevenção da Cegueira e Surdez da Organização Mundial da Saúde (OMS) durante a primeira Conferência Internacional de Prevenção e Reabilitação da Deficiência Auditiva.

O lema para este ano é mudar de Mentalidade – tornar os cuidados auditivos uma realidade para todos”. A escolha do tema tem como objectivo compartilhar informações e promover acções com vista à prevenção da perda auditiva , promoção dos cuidados auditivos, focando mais na função do que propriamente no órgão da audição.


Mais de 800 milhões de pessoas no mundo  sofrem de problemas auditivos

Acima de 800 milhões de pessoas no mundo sofrem de alguma perda auditiva e, entre os 20 e 40 anos de idade, a surdez pode atingir 15 por cento dessa faixa etária. Estes dados constam do primeiro relatório global sobre audição, lançado em 2021, pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo, ainda, com o relatório, até 2050, quase 2,5 bilhões de pessoas no mundo ou uma em cada quatro pessoas vão viver com um grau de perda auditiva. Sendo que, 700 milhões dessas pessoas vão precisar de cuidados auditivos e serviços de reabilitação.

No relatório, o director-geral da OMS, Tedros  Ghebreyesus, afirmou que a capacidade auditiva é muito preciosa e, se não for bem tratada, pode ter um impacto devastador na capacidade das pessoas de se comunicarem, estudar e ganhar a vida.

Tedros  Adhanom  Ghebreyesus, realçou, ainda, que os problemas auditivos podem afectar também a saúde mental das pessoas e a sua capacidade de manter relacionamentos.

Daí que, o primeiro relatório global sobre a audição destaca a necessidade de se intensificar rapidamente os esforços para se prevenir e tratar a perda auditiva, investindo cada vez mais na expansão do acesso ao serviço de saúde auditiva.

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