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Israel sem apoio internacional na operação terrestre em Rafah

Israel está cada vez mais isolado no plano de lançar um ataque a Rafah, sul da Faixa de Gaza na fronteira com o Egipto, com a retirada de apoio dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, principais aliados na guerra contra o Hamas, advertindo para potenciais consequências humanitárias sem precedentes.

14/02/2024  Última atualização 13H45
Benjamin Netanyahu mantém a ofensiva em Rafah como estratégia de eliminar o Hamas © Fotografia por: DR

Em Rafah, aos cerca de 200 mil habitantes que residiam na cidade, juntaram-se mais de 1,3 milhões de deslocados vindos no centro e norte do enclave palestiniano, na sequência dos numerosos ataques do Exército israelita contra posições do Hamas tanto em Gaza (norte) quanto em Khan Yunis (centro/sul), desde 7 de Outubro de 2023.

O Primeiro-Ministro, Benjamim Netanyahu, confirmou no domingo a entrada nesta semana das forças militares na cidade de Rafah, último refúgio de centenas de milhares de palestinianos deslocados à força na Faixa de Gaza, para acabar com "os batalhões que restam do Hamas”. Insistiu que a população civil daquela cidade deve "abandonar” a zona, com ou sem a ajuda das organizações humanitárias internacionais.

Até hoje, antes da anunciada grande ofensiva, vários ataques aéreos israelitas causaram pelo menos 164 mortos e 200 feridos em Rafah, depois de as Forças de Defesa de Israel (FDI) terem realizado "uma série de ataques contra alvos terroristas na área de Shabura”.

Segunda-feira, Israel pediu à ONU para que "coopere” na "retirada” dos civis que se encontram nas zonas de combate na Faixa de Gaza, incluindo a cidade de Rafah, face à iminente ofensiva terrestre do exército contra a cidade.

O porta-voz do Governo israelita, Eylon Levy, criticou que as agências da ONU "tenham estado a transferir civis para os redutos do Hamas e a validar a estratégia dos 'escudos humanos' do Hamas”.

"A guerra pode terminar rapidamente, sem mais sofrimento, se o Hamas se render imediatamente, depor as armas, libertar os reféns e levar os seus criminosos de guerra à justiça. Todos os intervenientes dedicados à protecção dos civis e à melhoria das condições humanitárias em Gaza devem apelar ao Hamas para que se renda agora, em vez de pressionar o Hamas para que mantenha os seus quatro batalhões de pé face a uma vitória israelita iminente”, argumentou.

Israel apontou ainda para "um encobrimento da militarização do Hamas de hospitais e bens militares dentro de instalações das Nações Unidas”, referindo-se à recente descoberta de um túnel sob a sede principal da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA) em Gaza.

Em resposta, o comissário geral da UNRWA, Philippe Lazzarini, sublinhou que o pessoal da agência "abandonou a sede na cidade de Gaza a 12 de Outubro, na sequência de ordens de evacuação emitidas por Israel e perante a intensificação dos bombardeamentos na zona” e apelou a uma investigação "independente”, apesar de o ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, Israel Katz, ter pedido a sua demissão.

 

Libertação de reféns

O Hamas avisou que qualquer operação das forças israelitas em Rafah ameaçará as negociações de libertação de reféns em troca de prisioneiros palestinianos e constituirá uma "catástrofe e um massacre global”.

O presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, que governa pequenas áreas da Cisjordânia ocupada, disse na sexta-feira que o plano israelita de expandir a ofensiva sobre Rafah faz parte da estratégia para "deslocar o povo palestiniano das suas terras” e apelou que a comunidade internacional aja para evitá-lo.

 ONU apela ao fim do conflito em Gaza

A ONU  já apelou variadas vezes ao fim do conflito e alertou que uma operação militar israelita em Rafah agravaria o "pesadelo humanitário” da população local, com "consequências regionais incalculáveis”.

O Presidente norte-americano, Joe Biden, pediu segunda-feira a Netanyahu que garanta a segurança dos 1,5 milhões de palestinianos concentrados em Rafah, reafirmando a opinião de que uma operação militar não deve prosseguir sem um plano credível e exequível para garantir a segurança e o apoio ao mais de um milhão de pessoas que aí se encontram abrigadas”.

Biden, que indicou que Washington não apoiará uma operação de tão grande escala, reafirmou o "objectivo comum” de ver o movimento islamita Hamas derrotado, ao mesmo tempo que apelou também para "medidas urgentes e específicas para aumentar o volume e a consistência da assistência humanitária aos civis palestinianos inocentes”.

O anúncio de uma operação em Rafah gerou preocupação na comunidade internacional, nomeadamente Alemanha, França, Reino Unido ou África do Sul, com o Egipto a ameaçar romper o tratado de paz com Israel se as tropas israelitas forem enviadas para aquela localidade fronteiriça.

A ameaça de suspender os Acordos de Camp David, pedra angular na estabilidade regional durante quase meio século, surge quando o Egipto receia um fluxo massivo de centenas de milhares de refugiados palestinianos que poderão nunca mais ser autorizados a regressar.

A União Europeia advertiu esta acção, a que o chefe da diplomacia dos 27, Josep Borrell, se referiu como "uma catástrofe humanitária indescritível”. A Turquia, através do Presidente Recepo Tayyp Erdogan, pediu segunda-feira ao Conselho de Segurança da ONU que "controle Israel” após os recentes ataques à cidade de Rafah.

A Turquia é um aliado histórico de Israel e, embora as relações tenham tido altos e baixos desde que o actual Presidente Recep Tayyip Erdogan chegou ao poder, em 2002, os dois países restabeleceram relações diplomáticas plenas no ano passado, com planos para uma cooperação estreita.

Os Países Baixos anunciaram já a suspensão da exportação de peças de aviões de guerra para Israel. Também a Arábia Saudita condenou os planos de Israel e pediu uma reunião urgente do Conselho de Segurança para evitar uma "iminente catástrofe humanitária”.

A China e a Rússia têm-se limitado a repetir na ideia de um cessar-fogo entre as partes, enquanto o Irão, que apoia as milícias anti-israelitas, como o Hezbollah, no Sul do Líbano, apelou à exclusão de Israel da ONU, manifestando novamente o apoio à causa palestiniana, vítima de "crimes contra a humanidade”.

A Amnistia Internacional (AI) afirmou ter "novas provas” de que os "ataques ilegais” de Israel na Faixa de Gaza causaram "um enorme número de vítimas civis” e que existe "um risco real de genocídio”, em que as tropas israelitas "continuam a desrespeitar o direito humanitário internacional, destruindo famílias inteiras com total impunidade”.

 Londres aplica sanções a colonatos israelitas

O Governo do Reino Unido anunciou na segunda-feira que colocou quatro colonos israelitas sob sanções, devido a acusações de abusos de direitos humanos contra palestinianos na Cisjordânia.

O Foreign Office [equivalente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros] justificou que as sanções decorreram de "níveis inéditos" de violência praticada pelos colonos na Cisjordânia, ao longo do último ano, incluindo os que assediaram e intimidaram agressivamente palestinianos para que abandonem as suas terras.

Acrescentou ainda que a inacção dos dirigentes israelitas resultou em uma "total impunidade" para os colonos. Os dirigentes do Ministério alegam que Moshe Sharvit e Yinon Levy ameaçaram famílias palestinianas com armas e destruíram-lhes vários bens nos últimos meses, como parte de "um esforço focado e calculado para deslocar as comunidades palestinianas".

Identificaram também Zvi Bar Yosef e Ely Federman como os ouros dois colonos sujeitos a sanções. Os quatro estão sujeitos ao congelamento de activos no Reino Unido e proibição de emissão de vistos e de viajarem para o país.

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, David Cameron, disse, em comunicado, que "os colonos extremistas israelitas estão a ameaçar os palestinianos, com frequência de arma em punho, e a forçá-los a saírem das terras que são suas. Este comportamento é ilegal e inaceitável”.

Acrescentou ainda que "Israel tem de agir para acabar com a violência dos colonos. Com frequência, vemos compromissos assumidos e promessas feitas, mas depois não acontece nada". As sanções britânicas seguem-se às adoptadas, no início deste mês, pelo Presidente dos EUA, Joe Biden, que também sancionou Levy, a par de outros três acusados de atacarem palestinianos na Cisjordânia.

Um advogado de defesa de direitos humanos, Eitay Mack, disse que, juntamente com outros, tinha documentado a violência de Sharvit contra agricultores palestinianos que forçaram, pelo menos, 10 famílias a saírem da área nas proximidades da quinta de Sharvit.

Mack, que integra um grupo de organizações que tem apelado para a aplicação de sanções a uma dúzia de colonos desde 2021, disse que as sanções vão afectar a capacidade de Sharvit financiar a sua quinta.

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