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Mau estado das vias impede escoamento da produção agrícola

Fula Martins | Soyo

Jornalista

À berma do portão da Fazenda “Nempemba” estão expostos diferentes produtos do campo, em sacos, baldes e banheiras.

30/03/2024  Última atualização 11H33
Estradas que fazem a ligação entre a cidade do Soyo e as comunas do Simba e Pedra do Feitiço estão intransitáveis © Fotografia por: Adolfo Dumbo|Edições Novembro

São produtos como, batata-doce, mandioca, banana, laranja, milho, abacaxi, repolho, jinguba, jindungo, beringela, cenoura, tomate, cacau, que estão à venda, a grosso e a retalho.

O cenário é idêntico em quase todas as quintas e fazendas localizadas no interior das comunas do Soyo.

Proprietários de fazendas/ quintas e camponeses, que praticam a agricultura familiar, lamentam o facto de muita colheita se deteriorar diante dos seus olhos, por falta de condições de escoamento para os grandes centros de consumo.

O proprietário e gestor da Fazenda "Nempemba”, na comuna da Pedra do Feitiço, Elias Juliana Francisco, disse ao Jornal de Angola, em jeito de ironia, que "nem com feitiço conseguimos levar os produtos para a cidade do Soyo”.

"Já não sabemos o que fazer e a quem pedir socorro”, lamentou.

Elias Juliana Francisco e os companheiros atribuem a responsabilidade pela deterioração dos produtos ao mau estado das vias, que estão intransitáveis.

Grito de socorro

Quando questionado se a administração tinha conhecimento da existência de enormes quantidades de produtos a se deteriorar nas fazendas e quintas, por falta de escoamento, Elias Juliana Francisco disse, com tristeza, que anualmente estragam, na sua fazenda, cerca de quatro toneladas de produtos diversos. Acrescentou que já lançou o grito de socorro, "mas, quem deve socorrer ainda não chegou e nem diz quando chega”.

Como uma desgraça nunca vem só, acrescentou, a chuva que cai, nos últimos dias, veio deteriorar, ainda mais, as estradas, logo o escoamento dos produtos vai continuar impedido.

Mesmo com os prejuízos, Elias Juliana Francisco afirma que não vai abandonar a actividade, porque já não sabe fazer outra coisa, senão a agricultura.

Para colmatar a situação, o agricultor sugere à Administração Municipal, por intermédio da Direcção da Agricultura, a disponibilizar motorizadas de três rodas para facilitar o escoamento dos produtos.

Picada transformada em matagal

Estevão Zombo, outro agricultor e representante da Cooperativa Agro-Pecuária Londa Kia Zombo, informou que a picada que dá acesso ao seu espaço transformou-se em matagal, com inúmeros buracos, o que desencoraja os camionistas que transportavam os produtos.

A título de exemplo, a Cooperativa Londa Kia Zombo, com mais de 171 hectares cultiváveis, produz grande quantidade de abacate, limão, laranja e cacau.

Neste momento, disse, quem sai do centro do município do Soyo para chegar à cooperativa, percorre a picada com uma viatura a todo-o-terreno ou, no mínimo, com uma motorizada de três rodas.

Estevão Zombo assegurou que tem 10 mil mudas de cacau em estufa, para serem plantadas brevemente.

A cooperativa dispõe, ainda, em estufa, de abacateiros, mangueiras, coqueiros, palmeiras, laranjeiras, tangerineiras e limoeiros.

 

Cooperativa José Miguel

O Jornal de Angola esteve, também, na Cooperativa Associação Familiar José Miguel.

Com 150 hectares cultiváveis, José Miguel, representante da cooperativa, informou que cultiva a cebola, feijão, mandioca, batata-doce, banana, manga, laranja, abacate, beringela, tomate, jindungo, ananás, cenoura, abacaxi, pimenta e possui dois aviários, com mais de três mil aves.

O agricultor, também, lamentou a deterioração dos produtos, por falta de escoamento.

Felipe Maria Kanga, representante da Cooperativa Deus, Pátria e Família, disse que das 20 toneladas de cana-de-açúcar produzidas anualmente, são aproveitadas apenas quantidades irrisórias. O restante estraga-se por falta de escoamento.

A cana deteriorada é distribuída às pessoas que residem nas imediações da Cooperativa, que a utilizam para o fabrico de bebida caseira, vulgarmente conhecida por "kaporroto”.

A camponesa Helena Adelina, que cultiva cebola, feijão, mandioca, batata-doce e citrinos, juntou-se ao coro das lamentações devido ao mau estado das vias, que impedem o escoamento dos produtos do campo. O mesmo sentimento foi manifestado por Gabriel Lopes Isabel, também camponês.

 Crédito para financiar o sector

Os agricultores lamentaram, igualmente, a falta de acesso ao financiamento agrícola.

Estevão Juliana Francisco, gestor e proprietário de uma fazenda, afirmou que a burocracia e a morosidade na concessão de crédito agrícola, no Soyo, está a desmoralizar os homens do campo.

Para que o acesso ao crédito agrícola seja célere, Celestina Helena Adelina sugere a inclusão das associações e cooperativas agrícolas no Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações(PRODESI), de forma a facilitar a comercialização do excedente.

Uma orientação técnica do Gabinete Provincial de Desenvolvimento Económico Integrado, frisou, ajudaria os agricultores a habilitarem-se ao PRODESI, com acordos de parcerias para se encontrar mecanismos viáveis para o aproveitamento da produção local.

 Viaturas entregues  pelo Estado

Os agricultores entrevistados por este jornal questionaram, também, o destino das viaturas entregues pelo Executivo, no âmbito do Programa Integrado de Desenvolvimento do Comércio Rural, para apoiar os camponeses.

Alguns afirmaram que cada comuna do Soyo beneficiou de um camião, mas este nunca chegou junto da comunidade agrícola.

Os mesmos alegam que o município do Soyo beneficiou de cinco camiões, que foram entregues a operadores de transportes de mercadorias.

João Torres Miguel, um dos operadores, reconheceu que as viaturas deveriam ser entregues aos agricultores para facilitar o escoamento dos produtos, o que não está a acontecer.

Umas das razões, no seu entender, resulta do facto de muitas fazendas não terem capacidade financeira para suportar a manutenção das mesmas, já que as estradas estão em péssimas condições.


Hortêncio J. Sabino, director do Desenvolvimento Integrado

Reabilitação das vias inscrita nas obras do PIIM

Contactado pelo Jornal de Angola, o director do Gabinete Municipal de Desenvolvimento Económico Integrado, Hortêncio Joaquim Sabino, afirmou que, recentemente, o Governo Provincial adquiriu viaturas todo-o-terreno, para facilitar o escoamento da produção do campo.

O responsável esclareceu que as vias que ligam a cidade do Soyo às comunas do Simba e Pedra do Feitiço, estão inscritas no Programa Integrado de Intervenção do Município (PIIM), para intervenção, cujas obras já foram adjudicadas.

Recentemente, disse, foram feitos trabalhos paliativos, que não ajudaram na circulação das viaturas.

Hortêncio Joaquim Sabino apelou aos agricultores do Soyo a organizarem-se em cooperativas, para beneficiarem das viaturas e não fazerem pedidos individuais.

Em relação às viaturas disponibilizadas pelo Executivo, o director do Gabinete Municipal de Desenvolvimento Económico Integrado esclareceu que as mesmas estão destinadas para apoiar o escoamento dos produtos. "Caso alguém vir um dos camiões a dedicar-se a outra actividade, deve comunicar às autoridades”, apelou.

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