Reportagem

Novo término de autocarros reprovado pela população por ter fraca presença policial

Manuela Mateus e Helma Reis

Jornalistas

A Administração do Distrito Urbano do Sequele, no município de Cacuaco, província de Luanda, tem sido alvo de duras críticas, por ter transferido o término de autocarros e mini-autocarros para um ponto da rua 5 da cidade do Sequele, considerado “inseguro” por utilizadores de transportes públicos.

28/03/2024  Última atualização 11H12
Distrito Urbano do Sequele em Luanda © Fotografia por: Edições Novembro
Apesar de receber críticas e pedidos de anulação da decisão tomada, a Administração do Distrito Urbano do Sequele parece não querer recuar, uma suposição que resulta do facto de a transferência do término ter sido uma resposta a reclamações feitas àquele órgão da administração do Estado por direcções de escolas e do único centro médico público, que funcionam perto do espaço onde embarcavam e desembarcavam passageiros, localizado junto ao entroncamento entre as ruas 3 e 7.

Moradores de prédios que estão ao lado do espaço onde estava o antigo término também participaram no coro de protestos das escolas e do centro médico, com a alegação de que a presença de pessoas atraía vendedores ambulantes, que faziam do local um espaço de venda de produtos diversos, incluindo bebidas alcoólicas, criando um "autêntico pandemónio”.

"Até já havia um cheiro forte de urina e fezes humanas”, comentou o morador Moisés do Nascimento que, em declarações ao Jornal de Angola, disse ter aplaudido a decisão da Administração do Distrito Urbano do Sequele, mas também a criticado, por não terem sido criadas, no seu entender, as "condições necessárias” no espaço onde está o novo término de autocarros e mini-autocarros, junto ao bloco 12.

Porém, não é tanto, ao que tudo indica, a transferência que está na origem da irritação de moradores que usam, frequentemente, os transportes públicos, mas, sim, a falta de condições no local para onde foi transferido o término.

O fraco policiamento no local, um défice que moradores dizem ser uma realidade em toda a cidade do Sequele, é o que mais sobressai do "pacote de reclamações” de usuários de transportes públicos, em decorrência da decisão da Administração do Distrito Urbano do Sequele.

A transferência do término para a rua 5 tem sido assunto de conversas em grupos de WhatsApp, integrados por moradores da cidade do Sequele, sendo os mais conhecidos e activos o "Sequele Alerta” e o "Conselho Morador Sequele”, estando o primeiro com 224 membros e o segundo com 367.   

Este jornal teve acesso, por exemplo, a um vídeo, partilhado num dos grupos, onde se podia ver uma moldura humana à espera, no período nocturno, supostamente de um dia útil, de entrar num autocarro que já estava estacionado.

A razão da partilha do vídeo é explicada por via de um comentário que resume a preocupação manifestada, diariamente, por quem utiliza, à noite, principalmente, o novo término para entrar ou sair da cidade do Sequele.    

"Este é o terminal dos autocarros na rua 5. Não há iluminação suficiente para garantir o mínimo de segurança. Além de poder acontecer assaltos, um dia alguém vai ser picado por uma serpente”, pode ler-se no comentário, que critica, também, as condições de acomodação dos passageiros.

O autor do comentário afirma que "as condições de acomodação são desumanas, para a nossa realidade, e que se pode oferecer mais do que as condições que se verificam no terreno”.

"(…) Quase nada do que se prometeu foi cumprido”, respondeu um outro morador, fazendo, implicitamente, referência à Administração do Distrito Urbano do Sequele, liderada, actualmente, por Francisco Tchipilica.

O novo término de autocarros e mini-autocarros está perto de uma área de muito capim e a precisar de mais espaços com sombra, natural ou artificial, por dispor apenas de um pequeno abrigo para passageiros, com capacidade para menos de 10 pessoas sentadas.

Só veio complicar

O motorista Manuel Paciência, da empresa "Cidrália”, não tem dúvida de que a mudança do término só veio complicar, por já não ser possível carregar, entre 10 e 15 minutos, o número de passageiros que corresponde à capacidade de um autocarro. Os motoristas são agora forçados a ficar mais tempo à espera que venham mais passageiros até ao novo término, algo que não acontecia no antigo, onde, antes da chegada de um autocarro, já havia muitos passageiros à espera em fila indiana.

São várias as pessoas que evitam chegar ao novo término, sobretudo à noite, por conta da fraca iluminação pública, da aparente insegurança e da distância. Por esta razão, as paragens que estão no interior da cidade do Sequele ficam, agora, apinhadas de pessoas, à espera de autocarros e mini-autocarros que saem do novo terminal.

Quem vive ou trabalha junto ao novo término pode ter uma posição ligeiramente diferente, como é o caso de Laura Domingos, uma empregada doméstica de um apartamento do bloco 12.

Laura Domingos reconhece que o novo término veio facilitar a sua vida, por estar próximo do seu local de trabalho, mas não ignora o risco que corre, pelo facto de este estar numa área com muito capim, isolada da maioria dos prédios da cidade do Sequele e com fraca iluminação pública.

Apesar de estar relativamente satisfeita, Laura Domingos lamenta que a mudança do término tenha criado transtornos à vida das pessoas que vivem ou trabalham distante da rua 12.

Laura Domingos foi abordada quando esperava por um autocarro no novo término, onde também já se encontravam várias empregadas domésticas. Uma delas, identificada como Adelaide Afonso, chegou a correr e a transpirar, para conseguir apanhar o autocarro que sai da cidade do Sequele às 16 horas.

Adelaide Afonso, empregada doméstica de um apartamento situado no bloco 2, explica que, quando termina mais cedo o trabalho, sai do serviço antes do horário estabelecido, para poder chegar a tempo de apanhar o autocarro das 16 horas.

"Mas não posso sair sempre cedo, para não abusar da confiança da patroa”, relata a empregada doméstica, acentuando que, apesar do sacrifício que faz para chegar à rua 5, vai continuar a optar pela viagem de autocarro, por não ter salário para se dar ao luxo de recorrer, com frequência, ao serviço de táxi.

João Vicente, um jovem que vive perto do local onde está ainda em construção o novo Hospital Geral de Cacuaco, é, também, uma das vozes que se manifestam contra a transferência do término para a rua 5.

A posição que defende é resultante do facto de ter aumentado as despesas com o transporte público, desde o dia em que foi feita a referida transferência.

"Agora tenho apanhado uma motorizada, para poder chegar ao novo término, algo que não fazia quando se localizava entre as ruas 3 e 7”, acentua João Vicente, rematando que, para quem vive distante, "o novo término de autocarros não facilita, quando se quer sair de casa cedo”.

Apanhados de surpresa

Félix Paulino, secretário da Organização Sequele, formada por proprietários de mini-autocarros que transportam passageiros com conhecimento e autorização da Administração do Distrito Urbano do Sequele, refere que, numa conversa com o administrador distrital, em finais do ano passado, a associação foi comunicada sobre a decisão de transferência do término para a rua 5, mas não foi avisada do dia, tendo apenas ouvido do administrador que "seria feita a qualquer momento”.

"Foi, para nós, uma surpresa”, acentua Félix Paulino, adiantando que os associados da Organização Sequele só tomaram conhecimento no próprio dia da transferência, quando surgiram, no antigo local, entre os dias 8 e 15 de Janeiro, funcionários da Administração do Distrito Urbano do Sequele, para  informar que, "a partir daquele dia”, os autocarros e mini-autocarros passariam a operar a partir da rua 5, onde está o novo término”.

Félix Paulino critica a Administração do Distrito Urbano do Sequele por, como diz, não ter preparado condições no novo terminal, como a melhoria da iluminação pública e o reforço do patrulhamento, revelando que, na primeira semana de existência do novo posto, presenciou um assalto de que foi vítima um aluno à noite.

"Já ouvimos dizer que, nesta zona, tem havido patrulhamento, algo que nunca vi”, acentua o secretário da Organização Sequele.

Francisco Tchipilica, administrador do Sequele

"Vamos aumentar a segurança pública,  instalar sombreiros e casas de banho”

Para obter uma reacção oficial, o Jornal de Angola contactou o administrador do Distrito Urbano do Sequele, Francisco Tchipilica, que, tranquilizando a população, revelou que vão ser instalados no local sombreiros e uma casa de banho pública, além do reforço da presença policial.

"O processo de transferência do término não foi uma acção tomada para prejudicar o cidadão”, declarou Francisco Tchipilica, que confirmou ter estado na origem da transferência do término para a rua 5 a necessidade de garantia de tranquilidade, "em termos de movimentação de pessoas”, no espaço onde se encontram escolas e um centro médico público em actividade na cidade do Sequele, habitada desde 2013. 

O responsável acentuou que, quanto à questão de segurança do local onde se encontra o novo término, a Administração do Distrito Urbano do Sequele "continua a trabalhar com os órgãos de defesa e segurança do distrito para garantir segurança de forma permanente”.

A uma pergunta sobre a manutenção da segurança pública na área onde se encontra o novo término de autocarros e mini-autocarros, Francisco Tchipilica respondeu: "Este é o segundo mês, desde que foi feita a transferência do término, e, até hoje, a esquadra local [ainda] não registou nenhuma anomalia, relacionada com roubo ou furto”.

Uma informação que, no entanto, colide com uma outra, avançada pelo motorista Manuel Paciência, da empresa de transportes públicos "Cidrália”, que disse ter chegado a presenciar, por volta das 19 horas, dois assaltos de que foram vítimas duas senhoras, tendo os meliantes fugido em direcção ao matagal que está ao lado do novo término.

Abordada, via telefónica, por este jornal, a intendente Josefa da Costa, comandante de uma das duas esquadras da cidade do Sequele, informou que a corporação nunca registou "qualquer queixa” de moradores, num contexto de deslocação ou saída do novo término de autocarros e mini-autocarros.

A oficial da Polícia Nacional prometeu, na conversa com o Jornal de Angola, um reforço do patrulhamento apeado, para o aumento do sentimento de segurança, no espaço onde se encontra o novo término, mesmo ao lado do bloco 12.

Josefa da Costa alegou que a presença policial tem sido permanente no local, onde o número de agentes em ronda é aumentado no período da noite.

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