Reportagem

Orquestra Kaposoka: Música clássica passou a ser a paixão de muitos jovens

Grupo tem mais de mil alunos de várias idades, distribuídos nas Escolas da Samba e Zango III, em Luanda, na Escola de Catete, com sede em Catete, e na Escola do Sumbe, província do Cuanza-Sul

13/02/2024  Última atualização 07H28
António Cazua Faustino regressou há quatro meses da Rússia, depois de se especializar em Violino, e hoje é professor de música na Orquestra Sinfónica Kaposoka © Fotografia por: Luís Damião | Edições Novembro

A Orquestra Sinfónica Kaposoka está a realizar sonhos de muitos jovens e a incentivar novos membros que afirmam, com orgulho, que a música clássica passou a ser a sua grande paixão.

Fundada a 10 de Outubro de 2008, a Orquestra Sinfónica Kaposoka tem mais de mil alunos de várias idades, distribuídos nas Escolas da Samba e Zango III, em Luanda, na Escola de Catete, com sede em Catete, e na Escola do Sumbe, capital da província do Cuanza-Sul.

No grupo dos mais de mil alunos inscritos, 62 estão na Rússia a fazer o curso superior de Música, desde 2018, dos quais cinco já concluíram a formação.

É o caso de António Cazua Faustino, que regressou há  quatro meses, depois de se especializar em Violino, no Instituto Superior de Cultura na República da Rússia, na cidade de Cheliabinsk, e hoje é professor de música na Orquestra Sinfónica Kaposoka.

Ele teve o primeiro contacto com  a Orquestra Sinfónica Kaposoka em Março de 2013, na altura, com 14 anos de idade.

Além do violino, aperfeiçoou o piano, aprendeu a tocar guitarra baixo, violão, regência e canto coral, a par  de outras disciplinas musicais que o tornaram ainda mais profissional no que faz.

"Crescemos na Escola de Música Clássica Kaposoka, onde temos de desenvolver outros talentos, ensinando outras crianças, que estão a ter o primeiro contacto com  instrumentos musicais clássicos”, disse, apelando aos  mais novos da Orquestra que pratiquem  mais os instrumentos musicais e tenham disciplina.

"O sonho pode tornar-se realidade e eu sou prova disso”, sublinhou António Cazua Faustino, agora com 24 anos. Além de ser professor de música na Escola da Orquestra na Samba, António Cazua Faustino apoia também nos trabalhos  administrativos.

 
Emiliana Carlos António continua a formação

Outra contemplada com uma bolsa de estudo na Rússia, onde continua a formação, é Emiliana Carlos António. A angolana está a fazer o curso de instrumentos de  Corda (maior violão de todos), no   Instituto Superior de Cultura de Crasnodar.

A frequentar o 2º ano, com ela estão mais 19 angolanos, no mesmo instituto, a fazer o curso superior de Música, sendo todos bolseiros.

Emiliana Carlos António, que esteve recentemente de férias em Luanda, estuda na mesma sala com mais três compatriotas, sendo que dois cursam violino e outros dois violoncelo.

"Formamos um quarteto”, frisou Emiliana Carlos António, que integra a Orquestra Sinfónica Kaposoka desde os 10 anos de idade.

"No princípio, quando passei a frequentar a Orquestra, não queria, mas, depois, passei a gostar, fui me adaptando e hoje é a minha grande paixão”, sublinhou a entrevistada, que destaca o facto de ter evoluído muito nos instrumentos musicais, principalmente no piano.

"Por ser boa no piano, já na Rússia fomos convidadas a tocar numa actividade local só para pianistas, porque, com a nossa base obtida em Angola, a adaptação foi fácil e com sucesso”, salientou, garantindo que a relação com os colegas russos é salutar.

 
Vários instrumentos musicais

 Na Orquestra Sinfónica Kaposoka, cada aluno tem a sua preferência de instrumentos musicais. Uns preferem o violino, outros a guitarra, o violoncelo, a flauta, e assim por diante. Quando se juntam, conseguem transformar a música angolana em clássica, denominada por "cancioneiro angolano orquestrado”, a exemplo da música "Wanga”, de Ângela Ferrão.

Avelina Felícia Lúcia é outra aluna que frequenta a Escola da Samba e faz parte da Orquestra Sinfónica Kaposoka desde os 8 anos de idade. Actualmente com 16 anos, a estudante aprendeu não só a tocar violino, mas também a disciplina, o saber-estar e a dedicação à música.

Para aprofundar mais as suas valências, ela sonha em ingressar numa universidade de música no estrangeiro, para aprender a tocar mais instrumentos musicais, principalmente o piano, a sua principal paixão. 

Além da música clássica, Avelina Felícia Lúcia tem como segundo sonho fazer o curso superior de Enfermagem. Actualmente, frequenta a 9ª classe, na Escola 1.019 da Samba.


Vérsia Cândida Carneiro vem do Libolo

Diferente dos colegas anteriores, Vérsia Cândida Carneiro, de 19 anos, toca flauta e faz parte da Orquestra "Maria Carolina do Libolo”, grupo irmão da Kaposoka.

Está em Luanda para aperfeiçoar as habilidades no instrumento e diz  sentir-se bem com o que faz. "A minha preferência é a flauta transversal, que é a minha paixão”, frisou Vérsia Cândida Carneiro, que, além da música, frequenta o último ano do curso médio de Ciências Económicas.

 
Modalidade rara entre as mulheres

Branca Manaças Chilombo, de 26 anos, toca violão baixo, uma das modalidades raras entre as mulheres, por anteriormente ser direccionado apenas para homens.

De tudo que aprendeu, a sua grande paixão é tocar o "contrabaixo”, o maior violão de todos. Como adulta, e com mais tempo de casa, aconselha as mais jovens, sobretudo as que pretendem ingressar na Orquestra, para que sejam persistentes e nunca desistam dos seus objectivos.

"Faço parte da Orquestra desde os 10 anos de idade. Comecei a tocar o mais pequeno violino e progredi para o gigante(violão baixo)”, frisou Branca Manaças Chilombo, que além da  música, tem como sonho fazer o curso de Pastelaria.

 
Catiana Pedro Francisco é especialista em violino

Catiana Pedro Francisco começou a frequentar a Orquestra Kaposoka aos 5 anos de idade. Diz que aprendeu, além da música, a honestidade e a gratidão, acima de tudo.

Especialista em violino, Catiana Pedro Francisco deseja, também, tocar outros instrumentos mais avançados, como  o piano. Estudante da 12ª classe, na escola Alvorecer com Saúde, no curso de Enfermagem, Catiana Pedro Francisco quer estudar Medicina, na especialidade de Oftalmologia.

"Quero ser médica e, ao mesmo tempo, violinista”, frisou, apelando aos principiantes da Orquestra Sinfónica Kaposoka que se dediquem mais para alcançarem os seus objectivos.

 
João Razão Miguel toca piano e violino

João Razão Miguel, de 20 anos, da Escola do Zango III, toca violino, piano e está na Orquestra desde 2014.

Quanto à sua experiência, conta que uma das coisas mais marcantes são as aulas de etiqueta, que ensinam como saber estar, falar e ser.

O violinista terminou o ensino médio na especialidade de Informática e Gestão.

Quanto aos desafios, João Razão Miguel pretende concluir o Curso Superior de Música. Para o efeito, vai candidatar-se a uma bolsa de estudo na Rússia.

 
Bruno Mauro de Frestas não vive "sem esse ritmo”

Outro especialista em violino é Bruno Mauro de Frestas da Conceição, que, com apenas 9 anos já era membro da Orquestra Sinfónica Kaposoka.

Desde que teve contacto com a música clássica,  disse, já não consegue viver sem esse ritmo. 

"Ganhei o gosto por isso, amo tocar violino e, para aperfeiçoar, continuo a praticar, para chegar ao mais alto nível da música clássica”, sublinhou Bruno Mauro de Frestas da Conceição, que está a fazer o curso médio de Enfermagem, a sua segunda paixão.


Dedicação e paciência do professor David Lopes

O alto desempenho dos alunos da Orquestra Sinfónica Kaposoka é fruto da experiência, dedicação e paciência do professor de música David Lopes, que se encontra em Angola no âmbito de uma cooperação com a Embaixada de Espanha.

No país desde 2018, David Lopes  dá nota positiva à Orquestra e  aos seus integrantes, por terem alcançado um grande desenvolvimento no que concerne à música clássica, com uma grande evolução na especialidade de cada aluno.

Segundo o próprio, os alunos evoluíram de forma muito positiva, apontando como prova o facto de muitos estarem a fazer formação superior na Rússia. "Quando regressarem, vão estar melhor qualificados para levar o nome de Angola ao mundo”, disse, sublinhando que "não é fácil aprender música clássica”.

 "É um processo difícil. No decorrer do aprendizado, o forte são as cordas e, no caso do sopro (outro instrumento musical), houve  também muitos avanços”, reconheceu David Lopes, que considerou como momento mais marcante da sua vivência a interacção com os alunos.

Uma conquista de angolanos para os angolanos

A Orquestra Sinfónica Kaposoka foi fundada pelo jurista Pedro Fançony, que considera o grupo uma conquista dos angolanos e um ganho que ficará na história.

Pedro Fançony anunciou que, dos 57 estudantes que se encontram na Rússia, 12 regressam ainda este ano, já formados em Música.

Quanto ao sucesso das Escolas, Pedro Fançony reconheceu ser resultado de muitos patrocínios que a Orquestra recebe, com maior realce para a Presidência da República, através da Primeira-Dama, Ana Dias Lourenço, madrinha da Orquestra Sinfónica Kaposoka desde 2018.

Com  o seu patrocínio, esclareceu, foi possível comprar, em Singapura, mais de 400 instrumentos musicais, entre violinos, violoncelos, contrabaixos e outros.  Fazem ainda parte do grupo de patrocinadores o Instituto Nacional de Gestão de Bolsas de Estudo (INAGBE), a ENDIAMA, a Sonangol, a Embaixada da Alemanha, que doou 22 instrumentos de sopro(trompa), e outras entidades que doaram violas eléctricas.

Pedro Fançony destacou a parceria com a Rússia, que considerou "um parceiro estratégico na formação” de quadros, sobretudo na especialidade de Música Clássica.

O fundador da Kaposoka esclareceu que a Orquestra recebe crianças com idades a partir dos 6 anos, provenientes dos bairros periféricos.

"Muitos alunos foram retirados das barrocas da Boavista, Chicala e Sambizanga e transferidos para o município de Viana, no Zango. Muitos deles entraram para a Orquestra e frequentam o curso superior na Rússia”, frisou Pedro Fançony, que anunciou a abertura, nos próximos tempos, de uma escola na província do Huambo. 

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