Sociedade

“Tento instruir os jovens na busca pelo conhecimento, pois só ele nos pode libertar”

Rui Ramos

Jornalista

Audília Rufino Milonga de Carvalho, Rosita para os familiares, é filha de um militar, Rufino de Carvalho, e de uma vendedora do mercado do Kicolo, Mozalina Milonga. Nasceu a 10 de Fevereiro de 1996, em Quibaxi, Bengo.

10/03/2024  Última atualização 09H26
© Fotografia por: DR

"Passei os primeiros anos de vida em Caxito e, em 2003, mudámos para Luanda e começámos a viver no município de Cacuaco, no bairro Paraíso, quando tinha sete anos de idade”, apresenta-se.

"Somos 16 irmãos. Eu sou a terceira filha do meu pai e a primeira da minha mãe. Sou apaixonada pela minha família e tenho como fonte de inspiração os meus pais, por serem pessoas humildes, trabalhadoras e educadoras, dispostas a correrem atrás do bem e do melhor para os seus filhos”, realça.

"Já passámos por situações difíceis, porém, ambos se mantiveram fortes e firmes, dispostos a dar um exemplo de resiliência aos filhos. Fiz o ensino primário numa escolinha no meu bairro, o colégio Nova Nação”, prossegue. "Apesar de hoje eu ser a Audília de Carvalho, amante do saber e da aprendizagem, confesso que no ensino primário dava muito trabalho aos professores e ao director da escola, Amadeu João Nhanga”.

"Embora vivêssemos num bairro onde a onda de criminalidade e a falta de oportunidades são gritantes, o meu pai nunca deixou de nos incentivar a escolhermos o caminho da busca do saber. No fim do primeiro ciclo, o meu pai orientou-me a fazer um curso num centro que abrira próximo de casa (MAPTSS) e aí conheci uma colega muito aplicada e inteligente, a Rosita. Tornamo-nos próximas e perguntava-lhe como é que ela fazia para entender as matérias e como explicava em público tudo o que estudava. Comecei a colocar em prática os seus ensinamentos”.

 
A primeira decepção

Em 2011, termina o primeiro ciclo e em 2012 inicia o ensino médio no colégio Kaweye, muito distante de casa. Fez o curso de Ciências Económicas e Jurídicas, que terminou em 2014, depois inscreveu-se na Universidade Agostinho Neto, no curso de Comunicação Social, mas não foi admitida e a família não tinha condições para ela frequentar uma universidade privada.

"Foi a minha primeira decepção na vida, chorei bastante, mas nunca perdi a esperança, decidi procurar emprego, porque precisava de trabalhar, já estava com 19 anos, mas a falta de oportunidades no bairro obrigou-me, em 2015, a ir viver com uma irmã no bairro Palanca, tendo conseguido um trabalho num centro médico no Maculusso”.

Passado um ano, em 2017, decide dar continuidade aos estudos na Universidade Técnica de Angola (UTANGA), no curso de Gestão.

"Era estudante e trabalhadora ao mesmo tempo, não foi fácil, e não era aquilo que eu queria enquanto académica, pois sempre gostei de cadeiras sociais e o curso de Gestão envolvia muitos cálculos”.

Audília termina o primeiro ano com muitas lacunas, infelizmente deixou de trabalhar e teve de trancar o ano. "Mais uma vez foi difícil para mim, porque sentia que o sonho de dar continuidade aos estudos estava longe de se concretizar, mas não perdi a esperança e tomei a decisão de ser autodidacta, voltei para o bairro Paraíso e comecei a dedicar-me a pesquisas e leituras, passei a assistir a programas nacionais e internacionais que tratavam de questões políticas e sociais, tornei-me assídua no programa Política no Feminino, fiquei apreciadora da socióloga Tânia de Carvalho”, recorda.

"Percebi que estava a mudar a minha forma de pensar, cada vez mais me interessava pela busca do saber, porém, sentia a necessidade de descobrir as minhas valências, o meu propósito, foi quando decidi ser cantora, compus e gravei a minha primeira música, "A vida é para os fortes".”

 
Uma canção para os doentes

No seu percurso como cantora, teve o convite para compor uma canção dedicada aos doentes de insuficiência renal. "Foi uma honra para mim, fiz a música com a ajuda do produtor LG no Bit, fui cantar no Hospital Maria Pia e na Pediatria de Luanda, foi muito marcante, tenho como uma tatuagem em minha alma ver o sorriso e alegria dos meus irmãos a sentirem-se felizes pelo facto de alguém ter feito uma música para eles”.

A partir desse momento, prossegue, "emergiu a vontade de querer fazer algo pela nossa amada pátria Angola”. Na busca pelo seu propósito, fez o casting para apresentadora de TV no concurso Diamante Bruto da ZAP e na Palanca TV. Começa, então, a prestar mais atenção à maneira como abordava diferentes temas e decidi ser comentadora de programas.

Audília deixa o contacto na TPA, corria o ano de 2020, e duas semanas depois recebe a ligação de Miguel Manuel para participar no programa Nossa Geração.

Ainda em 2020, tenta voltar aos estudos, inscreve-se em Direito, mas a Covid-19 interrompe as aulas. "Foi um balde de água fria, mais uma vez vi o meu sonho adiado, mas já estava treinada, fiz o primeiro ano e percebi que era mesmo aquilo que eu queria como estudante, no segundo ano, em 2021, decidi ir à Rádio Cacuaco e a jornalista Teresa Dias inscreveu-me como comentarista residente, fui conciliando a faculdade e os programas de rádio. "A Rádio Cacuaco para mim é como uma escola, aprendi e aprendo bastante lá como comentadora”.

No terceiro ano da Faculdade, é aceite para integrar o escritório JOMC-Advogados e, no início de 2023, recebe a proposta da Associação de Capacitação a Cidadania e Prevenção da Delinquência Juvenil (RAPCDJ) para ser a secretária, no bairro Paraíso. "Recebi a proposta com muito entusiasmo, pois vi nela a oportunidade de ajudar os jovens do meu bairro a terem uma visão diferente daquela que é a comum. Hoje, faço parte do projecto Aprendiz de Direito, que criei com Mavungo Timóteo Mbaco, para promovermos a cultura jurídica”.

"Ao completar o quarto ano da universidade, tento instruir os jovens na busca pelo conhecimento, pois só o conhecimento nos pode libertar”, conclui.

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