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UE pretende ocupar o lugar da SADC em Moçambique

Portugal vai propor em Bruxelas uma "alteração ao mandato" da União Europeia junto das Forças Armadas de Moçambique, face à saída da missão internacional da SADC de combate ao terrorismo em Cabo Delgado, anunciou, ontem, o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho.

15/02/2024  Última atualização 13H00
Ministro Gomes Cravinho realça a participação de forças portuguesas na missão da ONU na RCA © Fotografia por: DR

"Com a experiência que adquirimos e com a mudança da realidade no terreno, em função da saída das tropas da SADC - Comunidade de Desenvolvimento da África Austral-, vamos propor uma renovação e alteração do mandato da formação da União Europeia para ser um pouco mais abrangente na experiência de combate no Norte de Moçambique”, disse ontem o ministro dos Negócios Estrangeiros português à Lusa, ao telefone a partir de Kigali, onde se encontra em visita oficial.

O Rwanda, salientou João Gomes Cravinho, "é um parceiro muito importante" para Portugal, "um país que presta muita atenção ao continente africano", e "um protagonista de primeira importância" em cenários onde militares portugueses estão empenhados, como Moçambique e República Centro-Africana (RCA).

Na sua deslocação a Kigali, o chefe da diplomacia portuguesa encontrou-se com o  homólogo, Vincent Biruta, e com o ministro da Defesa, Juvenal Marizamunda, bem como com autoridades da União Europeia e empresários portugueses.

O Rwanda tem desde Julho de 2021 uma força militar autónoma destacada em Cabo Delgado, no combate aos grupos terroristas que actuam no Norte de Moçambique desde há seis anos, operando em conjunto com as Forças Armadas moçambicanas. Juntaram-se ainda a estas operações militares dos países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), através da missão SAMIM, que deverá deixar até Junho.

"A SAMIM começou a fazer as operações de retirada e em Junho já terá saído do teatro, o que deixa um certo vazio e, portanto, um dos temas da nossa conversa foi precisamente como apoiar Moçambique a evitar que esse vazio seja aproveitado por forças terroristas em Cabo Delgado", disse Gomes Cravinho.

Portugal assumiu o comando da Missão de Treino da UE em Moçambique (EUTM-MOZ), iniciada em Setembro de 2022 e com um mandato de dois anos. A actual missão é constituída por um contingente de 117 pessoas, 65 das quais portuguesas. No encontro com os dois governantes rwandeses, o ministro abordou a situação na RCA, onde Portugal tem cerca de 250 militares envolvidos nas missões das Nações Unidas (Minusca) e UE.

"A grande questão é a presença no terreno das forças  Wagner que, entretanto, foram mudando de nome (..), forças privadas que estão a explorar minas e, portanto, estão também a degradar muito a pouca autoridade do Estado da República Centro-Africana", indicou o ministro.

Portugal e Rwanda debateram "como eliminar a presença das forças mercenárias para que a RCA possa assumir as suas próprias responsabilidades", nomeadamente apoiando a formação das Forças Armadas da República Centro-Africana "sem permitir que elas venham a ficar sob comando precisamente desses mercenários", acrescentou. Nos encontros, foram abordadas os conflitos no Médio Oriente e Ucrânia e também "várias crises que assolam o continente africano", como na Região dos Grandes Lagos, no Sudão e no Sahel.

 Empenho policial na luta contra os raptos

O chefe do escritório da Agência das Nações Unidas sobre Droga e Crime (UNODC) em Moçambique reconheceu, ontem, o "empenho" das autoridades no combate aos crimes de raptos no país, garantindo apoio técnico e material.

 "Vai demorar algum tempo, como é óbvio. São esforços que demoram tempo, mas o empenho que nós estamos a ver, dos nossos parceiros nacionais, é extremamente promissor", afirmou António De Vivo, em declarações aos jornalistas à margem da abertura, em Maputo, de um seminário sobre a Estratégia Nacional de Combate ao Crime Organizado em Moçambique.

O responsável acrescentou que a UNODC está a trabalhar com a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Serviço Nacional de Investigação Criminal (Sernic) "em termos de capacitação técnica, assim como de fornecimento de equipamento especializado", para "implementar uma resposta mais eficaz", a qual ainda levará tempo. "As respostas podem demorar, mas o que eu posso garantir é que a resposta dos parceiros nacionais, do Sernic, da PGR, de todos os parceiros com os quais trabalhamos, é uma resposta muito séria. São todos parceiros que estão extremamente empenhados, compreendem todas as necessidades de uma resposta rápida e eficaz", apontou o chefe do escritório da UNODC.

António De Vivo disse que ainda "precisa de ser aprofundado" e "investigado" se estas redes que se dedicam aos raptos em Moçambique, sobretudo de empresários, libertados mediante pagamento de resgate, estão "ligadas ou não".

A UNODC é uma agência das Nações Unidas especializada nos assuntos de justiça criminal, droga e crime, estando a colaborar com o Governo de Moçambique ao abrigo de um acordo-quadro para as áreas da criminalidade organizada transnacional, resposta à ameaça terrorista em Cabo Delgado e ao fenómeno da corrupção.

A onda de raptos em Moçambique começou em 2011, afectando sobretudo empresários e seus familiares, sendo frequentemente confirmada a participação de polícias e magistrados, entre outros, nestas redes, com ramificações que se estendem até à vizinha África do Sul. Após um período de relativa estabilidade, os casos voltaram a ser registados nos últimos anos, principalmente nas capitais provinciais, com destaque para Maputo.

A  20 de Janeiro, um empresário foi raptado na capital moçambicana por um grupo de homens armados, dois dos quais já detidos, mas a vítima "continua em cativeiro", segundo os últimos dados avançados pela polícia. No dia 16 de Janeiro, um gestor de uma loja de venda de mobília foi ferido no abdómen durante uma tentativa de rapto frustrada por populares que atiraram pedras contra os autores do crime, disse à Lusa o porta-voz da Polícia em Maputo, Leonel Muchina.

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