Opinião

Diplomatas africanos

Sousa Jamba

Jornalista

A importância da expertise na diplomacia africana não pode ser subestimada. O recente escrutínio público em torno do indicado no Quénia para cônsul-geral em Goma, na República Democrática do Congo (RDC), desencadeou um debate crucial sobre o processo de selecção de diplomatas.

19/04/2024  Última atualização 06H50

A falta de conhecimento económico e político demonstrada pelo indicado, Charles Githinji, reflecte uma tendência preocupante: a nomeação de diplomatas africanos que carecem da expertise fundamental necessária para papéis tão vitais.

A controvérsia em torno da nomeação de Githinji pelo Presidente  do Quénia para um cargo diplomático em Goma destacou sérias questões sobre o calibre dos diplomatas do continente africano, levantando preocupações sobre a representação de África no palco internacional.

Preocupações semelhantes surgiram na Tanzânia, onde a nomeação de uma ex-rainha da beleza como embaixadora adjunta em Genebra provocou grande controvérsia. Críticos enfatizaram os altos riscos da diplomacia internacional e a necessidade de assertividade e expertise comprovadas, enquanto os apoiadores destacaram o seu background em relações públicas e qualificações académicas.

Esta discussão contínua destaca a necessidade de um quadro  baseado no mérito para atribuições diplomáticas, garantindo que aqueles que representam as nações africanas no palco mundial estejam equipados para garantir o crescimento económico, os interesses nacionais e um lugar respeitado para os seus países num mundo cada vez mais complexo.

A África não se pode dar ao luxo de ter os seus interesses mal representados no palco global. Agora é hora de se comprometer a colocar indivíduos qualificados e conhecedores em posições diplomáticas-chave.

Como o ex-ministro das Relações Exteriores britânico Douglas Hurd observou uma vez, os diplomatas certos podem permitir que um país se destaque no mundo. A diplomacia desempenha um papel crucial no sucesso estratégico, mesmo para países sem poder militar significativo. É imperativo que os diplomatas africanos possuam a expertise para enfrentar os desafios do século XXI, pois o futuro do continente depende disso.

A Área de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA) surge como uma iniciativa fundamental voltada para impulsionar o comércio intra-africano e avançar a posição de África no mercado global, estabelecendo um mercado unificado para bens e serviços. Este esforço está alinhado com a Agenda 2063 da União Africana, que visa uma África integrada, próspera e pacífica.

Na África Ocidental, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) persegue a sua visão estratégica, a Visão 2050 da CEDEAO, visando paz e prosperidade em todos os seus países-membros. Da mesma forma, a Comunidade da África Oriental (EAC) articula os seus objectivos de desenvolvimento na 6ª Estratégia de Desenvolvimento da EAC, enfatizando o desenvolvimento de infra-estruturas, integração de mercados e aprimoramento do capital social.

Na África Central, através da Comunidade Económica e Monetária da África Central (CEMAC), são implementadas reformas para fortalecer os programas dos países-membros, buscando estabilizar o cenário económico regional. A Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) contribui, por meio de seu Quadro Estratégico, para a Economia Baseada na Vida Selvagem, reconhecendo o papel da biodiversidade no desenvolvimento económico sustentável.

Apesar da natureza intricada da coordenação dessas estratégias regionais e dos desafios externos que podem dificultar a sua execução, a necessidade de expertise diplomática permanece fundamental. Diplomatas hábeis em navegar por essas complexidades, discernir prioridades e canalizar criativamente esforços em direcção a objectivos colectivos são indispensáveis. Isso garante que os objectivos estabelecidos por esses órgãos africanos, por meio de uma convergência colaborativa, possam ser efectivamente alcançados.

No intrincado cenário da diplomacia africana, especialmente no que diz respeito à significância geopolítica do rio Nilo, os diplomatas devem possuir uma compreensão abrangente da centralidade do rio para a política e economias da região. O Nilo, uma artéria vital para países como o  Egipto e Etiópia, está no cerne de dinâmicas agrícolas e hidropolíticas complexas. Os planos de desenvolvimento da Etiópia, incluindo a expansão agrícola, impactam directamente os países a jusante, criando um equilíbrio delicado de interesses entre os países dependentes do Nilo.

O Corredor do Lobito serve como um exemplo primordial da interconexão das economias africanas, destacando a importância da infra-estrutura estratégica para o aprimoramento do comércio regional. Os portos de Dar es Salaam, Durban, Walvis Bay e Lüderitz são componentes integrais dessa rede; decisões que afectam o Corredor requerem consideração cuidadosa de múltiplos factores.

Para navegar efectivamente por essas complexidades, os diplomatas africanos devem estar bem versados em História, Ciência Política e Economia. O contexto histórico fornece insights sobre os temas orientadores da diplomacia 0africana-busca-de justiça, desenvolvimento e paz, juntamente com a busca por solidariedade e integração dentro do continente. A Ciência Política e as Relações Internacionais oferecem frameworks para compreender interacções estratégicas entre Estados e actores não estatais nos palcos regional e global. A economia, especialmente o emergente campo da diplomacia económica, é crucial para avançar os interesses económicos dos Estados num mundo cada vez mais interligado.

Em essência, o papel de um diplomata africano transcende a mera negociação; ele requer uma abordagem holística, que incorpore pesquisa científica para apoiar o planeamento e informar as políticas governamentais. Esta expertise multidisciplinar é essencial para que os diplomatas africanos representem e promovam eficazmente os interesses das suas nações diante dos desafios e oportunidades únicos do continente.

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