Opinião

O ensino bilingue e a valorização da língua materna

José Correia André*

Colaborador

A língua como instrumento de comunicação e expressão por excelência deve ser objecto de um ensino que corresponda às nossas necessidades de actualização das potencialidades, segundo os elementos de ordens física, intelectual, afectiva, social, moral, profissional e religiosa. Naturalmente, se a língua é um instrumento, importa que funcione, isto é que preencha os objectivos de uma comunicação eficiente e da expressão criadora para auto-realização e integração social.

23/02/2024  Última atualização 07H10
O Dia Internacional da Língua Materna foi instituído pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em novembro de 1999, sendo celebrado pela primeira vez em 2000. O  seu objectivo é promover a diversidade linguística e cultural, bem como o multilinguismo. Muito do património imaterial da humanidade é determinado pela capacidade dos povos de transmitir suas tradições culturais, e isso é possível graças às nossas línguas nativas. A sua preservação e uso são essenciais para dignificar os povos indígenas e construir um futuro mais justo e sustentável para todos, conforme indicado nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável. A UNESCO assinalou que um grande número de línguas nativas está ameaçado de desaparecimento: "Em média, uma língua desaparece a cada duas semanas, levando com ela todo seu património cultural e intelectual.

O historiador mexicano Miguel León Portilla escreveu: "quando uma língua morre, uma janela, uma porta se fecha a todos os povos do mundo... Quando uma língua morre, a humanidade empobrece”. A diversidade cultural e linguística nos enriquece. Promover a capacidade de diálogo entre as diferentes culturas é uma tarefa fundamental para alcançar uma sociedade que respeite as diferenças, razão pela qual esta data constitui uma importante estratégia para a promoção da diversidade cultural.

Angola é um país plurilingue assim como outros países do continente africano, onde existem as línguas nativas, onde o português é tido como mais privilegiado por ser a língua oficial. Isto deixa as crianças na posição impossível de tentar decifrar o que está a ser ensinado numa língua desconhecida. As crianças em zonas recônditas, que falam uma língua diferente em casa, têm sérios problemas de aprendizagem na ʺlíngua da escolaʺ - com a qual não têm contacto fora dela. Este é um dos principais factores que contribui para a baixa qualidade da educação, para os baixos resultados de alfabetização e para as altas taxas de abandono escolar no país. 

Apesar de provas esmagadoras sobre o valor e benefícios da educação na língua materna, poucos países investem nela. Contudo, levar as crianças a praticar mais de uma língua e promover um ensino em línguas nacionais ou procedendo uma língua estrangeira em simultâneo parece ser hoje uma chave do sucesso escolar. No nosso caso, à luz da situação sociolinguística existente, onde coabitam crianças com o português como língua materna e outras cujas línguas maternas são as línguas nacionais como Kimbundu, Kikongo, Umbundu, Ngangela, Oshiwambu, Cockwe e outras, pensamos que a adopção de dois tipos de metodologia poderá servir para solução do problema, assim como afirma o Professor Victorino Reis. É urgente a formulação de políticas que incorporem estes resultados para enfrentar a baixa qualidade da educação no mundo em desenvolvimento. Também é central tornar a educação mais inclusiva e garantir o direito à educação para todos.

O bilinguismo é adoptado como um método activo que processa através de uma didáctica que se quer convergente e consiste numa aprendizagem paralela das línguas nacionais e de uma língua segunda no sentido de chegar à um bilinguismo funcional.

 Queremos com isso reforçar a vantagem da língua materna para uma educação eficiente com três principais factores: a primeira, porque a língua materna é uma ferramenta cognitiva disponível para todos os alunos, que permite uma aprendizagem eficaz. A segunda consiste na dimenção de equidade social ao oferecer a cada aluno a possibilidade de usar essa ferramenta. Finalmente a terceira, o ensino da língua materna favorece a manuntenção do multilinguismo e da diversidade linguística.            

*Professor e Linguista

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião