Opinião

O resgate do colectivo de Artes Chissola

Edson Kassanga

* Especialista em governação e gestão pública

Ao ler Pepetela, na obra 'Lueji: O nascimento de um império', percebe-se que Lueji citadina é um tanto quanto actual. Apesar de muito atarefada com as imensas exigências que lhe eram acometidas enquanto estudante universitária, dedicava-se à arte com elevado profissionalismo.

23/03/2024  Última atualização 09H10

Muitas instituições artísticas angolanas têm origem relacionada com as universidades. Entretanto, a instituição artística sobre a qual se impõe tecer algumas considerações não está propriamente ligada à dança, nem a arte praticada por Lueji.

A Nev@lflor Produções, Produtora de Eventos Culturais, Cinematográficos e Audiovisuais, tornou-se uma realidade por via da I e II edições do Festival Angolano de Teatro de Monólogo (FAMO), tendo como um dos objectivos provocar reflexões à volta do teatro angolano.

O certame, que tem sido realizado na província do Huambo, também, constitui-se num estimulante para as paixões adormecidas por situações de diversa natureza. Actores que já haviam "pendurado as botas”, por mais de quatro anos, sentiram tão intenso impulso que tiveram a decisão de voltar a fazer teatro, ressuscitando o colectivo de artes de que eram membros. 

Odília Ngongoyavo e Sacalei Freitas, par de jovens actores pertencentes ao Colectivo de Artes Chissola, foram preparados - desde o término da II edição do FAMO, realizada no dia 26 de Novembro de 2023- para vislumbrar as respectivas sombras projectadas sob as luzes da ribalta. A Nev@alflor Produções produziu dois espectáculos especiais de teatro nos quais Odília e Sacalei deram vida aos personagens da conhecida peça 'Casados e cansados', "Carolina" e "Dragão", respectivamente.

Nas apresentações da peça escrita pelo dramaturgo e vigente presidente da Associação Angolana de Teatro, Tony Frampênio, decorridas, nos dias 02 e 03 de Março de 2024, na cidade do Huambo, constaram as assinaturas de Agú Água, na encenação e adaptação, bem como a de Ariany Teixeira, na direcção executiva.

O referido colectivo de artes é resultado das várias edições do 'Jango Cultural', actividade de periodicidade semanal realizada na Faculdade de Economia da Universidade José Eduardo dos Santos, às tardes de Sábado, em que a discussão sobre múltiplos assuntos e as intervenções teatrais eram desenvolvidas pelos estudantes da mesma instituição de ensino superior, alguns dos quais, eram talentos em estado bruto.

Oficialmente, o Colectivo de Artes Chissola só veio a ser criado algum tempo depois, mediante um "casting", com o propósito de satisfazer a necessidade de preencher o vazio lúdico e inclusivo que se registava na Faculdade de Economia, tanto no seio dos estudantes, quanto no seio dos professores.

Uma nota de realce recai para o actor, encenador, dramaturgo e Director-Geral da Nev@lflor Produções, Nelson Nhanga, por ter dinamizado as principais diligências que tiveram como respaldo o surgimento oficial do colectivo de artes, exactamente no dia 08 de Abril de 2008.

A julgar pela assinalável experiência na arte de representar, acumuladas maioritariamente da agremiação teatral denominada Vozes de África, ele dirigiu a avaliação dos candidatos a actores e aceitou, por determinados meses, o desafio para dirigir a instituição ora constituída. 

Um dos felizes aprovados ao olhar do igualmente escritor Nelson Nhanga, cuja concentração mistura a ciência do investigador e a intuição da mulher idosa em visão, foi Sacalei Freitas, um actor que, nos dias de hoje, detém o nome nos funcionários do Governo Provincial do Huambo, e grande conhecedor do percurso histórico do grupo, de que se destacam as obras  'Lar Doce Lar', 'Os trinta dias', cuja desenvoltura em palco consagrou o grupo como vencedor do Festival Provincial de Teatro, edição 2008.

A folha de serviço do Colectivo de Artes inscreve, ainda, no seu portfólio, três participações no festival do grupo teatral Vozes de África, bem como o prazer de ser o único grupo sediado fora da cidade de Luanda, que venceu o Prémio Nacional de Cultura e Artes na categoria de Teatro. É mister realçar que o Colectivo de Artes Chissola deixou de pisar os palcos em 2018.

Prevalece, em Angola, a noção de que o teatro é uma manifestação artístico-cultural desenvolvida apenas por gente miúda e desocupada. Para a grande maioria da população desse país soa a mandarim ouvir dizer que o teatro é a mãe das artes. Ou melhor, a população está longe de entender o seu gigante poder de desabrochar qualidades cuja ausência na nossa sociedade condena-a à perdição.

Decorrente das exigências, dentre elas a de trazer aos espectáculos várias linguagens, o teatro trabalha em aspectos que vão da música à linguagem gestual, da psicologia à literatura, da dança às artes plásticas, da oratória à cultura e etc. Esta polifonia possui um peso considerável na criação de empatia, resiliência, tolerância, amor ao próximo, equilíbrio emocional entre outras qualidades indispensáveis para qualquer sociedade.

 

*Estudante de Relações Internacionais

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