Por conta de algum ajuste da pauta aduaneira, concretamente relacionada com a taxação dos produtos de uso pessoal, nos últimos dias, a Administração Geral Tributária (AGT) esteve, como se diz na gíria, na boca do povo. A medida gerou uma onda de insatisfação e, sendo ou não apenas a única razão, foi declarada a suspensão daquela modalidade de tributação, nova na nossa realidade.
Persigo, incessante, mais um instante para privilegiar o sossego. Para a parte maior da raça humana, pondero tratar-se da necessidade que se vai evidenciando quando a tarde eiva as objectivas da vida. Rastos de águas passadas há muito direccionam o moinho para a preciosidade do tempo.
Um dia telefonei ao meu parente Fançony, da orquestra Kapossoka, a perguntar se tinha um afinador de piano. Que sim. Um espanhol. Definitivamente, eu queria pôr o piano a funcionar, um piano que dava um romance. O resto eu já contei. Foi o David Lopez que ficou logo meu amigo e, a partir daí, consolidamos uma amizade e diálogo constante sobre o cisanji, que muitos escrevem kissanji, sua origem, eu ligava a música ao homem mais antigo.
Então haveria de ter o primeiro instrumento musical. Mas não é. Também as investigações foram mais avançadas na Europa e considera-se o instrumento mais antigo, a flauta, feita do osso da asa de uma águia, tem mais ou menos 82 mil anos, encontrada dentro de uma caverna, no Sul da Alemanha, junto com fragmentos de três flautas de marfim. A flauta mais antiga tem dois orifícios, a flauta de Bizet tem oito orifícios à frente e um para o polegar (oitavação) na parte traseira do instrumento. Mas tem quem fale no tambor.
O David foi-me falando do seu trabalho de investigação na Lunda-Norte, aproveitando o Museu. O cisanji da minha infância não era de boa memória, tocado por cegos guiados por uma criança que recebia as esmolas. E tinha meia cabaça por baixo.
Hoje, travei a ideia de que o cisanji pudesse ser um dos primeiros mas não porque as lamelas são em metal e, portanto, não são da idade da pedra.
E o Lopez começou a investigar a música dos Lundas, tchocués ou quiocos, que essa de escrita para baralhar não vale a pena.
De que se segue que o David fez investigação, escolas, sistematizou instrumento, ritmos e melodias, preparou tudo bem com as tecnologias de ponta e veio a Luanda com uma turma de músicos, dançadores e dançadeiras. No palco do Camões, uma instituição que muito tem dado à cultura angolana, inclusive com biblioteca aberta. Trabalhei muito no Camões, no tempo da antiga directora, a Teresa.
O cisanji foi com os escravos para o outro lado do mar com o nome de Kalimba (palavra do Uganda). Em sua companhia foram os tambores (atabaques), berimbau, reco-reco, agogô (uma preciosidade) afoxé, e cuíca, o meu instrumento com quem conversei muitos anos no "tempo da cólera.”
É preciso não esquecer o berimbau, a capoeira e a maioria de instrumentos que hoje compõem as alas das baterias das escolas de samba. Mas o Kalimba quase desapareceu. Nada. Um amigo meu do candomblé falou-me em cerimóniais em que aparece mulher tocando uma espécie de cisanji. Passei 15 dias num santuário de candomblé, numa favela da Bahia e também nada, só a mãe de santo tinha memória remota.
O David construiu um cisanji com amplificação e tocou no Huambo, na inauguração do Centro Cultural.
Agora, hoje terça, estou a voltar do Camões. Estava o embaixador de Portugal (bem querido aqui), o embaixador de Espanha, da União Europeia, a representante do nosso Ministério da Cultura.
Mas quando entrou o grupo com os tambores, "os chocalhos na canela,” como disse o Chico Buarque, o Camões começou a estremecer, o xinguilamento a subir, os corações a pulsar, parecia uma viagem numa caravela nova, de mil cores. A ibéria e nós no ritmo. No Camões. A vida renascia. Todos sentiam a força da arte para unir.
Foi uma grande lição de amor. O céu não caiu porque as estrelas todas estiveram no Camões. Aqui. Em Luanda. Os Lundas vieram ensinar como fizeram um triângulo de penetração para o sul, sem guerras. Ensinando a pintar as paredes das casas com basalto, ensinando o pai da desejada a caçar, a pescar e a cozinhar petiscos com lossacas que lá não se chamam assim.
Um dia estava numa almoçarada no Rio de Janeiro, numa casa na floresta, ofereceram-me de aperitivo lossacas com sal. O que é isto? Jiló. Outra vez no Dundo, pirei-me e fui ao mercado. O que é isto? Jiló. Então os escravos que levaram jiló eram Lundas. E Agora?
Vamos nessa caravela nova com estrelas lundas a brilhar no Camões. Em Luanda.
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