Opinião

Segredos do Huambo…

Tazuary Nkeita

Jornalista e Escritor

Não ia ao Huambo desde Maio de 2012, altura em que apresentei o romance “O Último Segredo” no Jardim da Cultura, na companhia do falecido embaixador Luís Neto Kiambata e numa iniciativa da Brigada Jovem de Literatura, liderada pelo também mui jovem João Lara Hotalala, então secretário-geral. Para quem não o leu, o “Último Segredo” é um retrato da vida social angolana em três gerações, que vão passando “testemunhos” de mão em mão, até aos recém-nascidos...

07/04/2024  Última atualização 12H19

E, ao desembarcar para a apresentação desse livro no Planalto Central, dei conta de que os segredos do Huambo começavam à chegada, no aeroporto. João Lara Hotalala confidenciou-me: "O primeiro livro que li na minha vida foi o seu, ‘A Voz dos Dibengos’, uma oferta do meu pai. Mas, quando lhe disse que o senhor tinha aceitado este convite, para vir até aqui, ao Huambo, apresentar o ‘Último Segredo’, ele duvidou de mim”…

Alguém escreveu que "nenhum mortal deve julgar-se inexcedível em sabedoria e inteligência”, e é verdade. Confesso que nada mais fiz do que rir e dizer: "Vamos então fazer uma foto e enviar para o teu pai…”

Doze anos depois, voltei ao Huambo com um outro livro, "Os Bantu na visão de Mafrano”, cuja apresentação estava inscrita nas festividades do 23 de Março, o Dia da Libertação da África Austral. No meu íntimo, tinha então a esperança de um reencontro com o João Lara Hotalala que infelizmente não compareceu nem justificou a ausência, apesar da curta mensagem que me enviou na véspera: "Será um prazer voltar a vê-lo”, dizia ele.

Sem saber porquê, voltei a recordar que "nenhum mortal deve julgar-se inexcedível em sabedoria e inteligência”. Na verdade, os segredos do Huambo não acabaram ali.  Não esteve o Lara, mas estiveram Sua Majestade Artur Moço, o Rei do Huambo, e dois emissários do Rei Tchongolola Ekuiki VI, do Bailundo, além do Chefe do Departamento de Cultura do Governo Provincial, Pascoal Nhanga.

Tive a honra de acolher o Rei do Huambo, à chegada, e, perdoem-me a ignorância, ainda não sabia que era ele.

"Recebi um convite para a vossa cerimónia e aqui estou”, disse-me Sua Majestade com a maior modéstia quando me identificou como organizador do evento.

"Seja bem-vindo! Confesso que sou o criminoso que o convidou”, respondi-lhe textualmente, com um sorriso.

Desta vez, era eu quem estava na pele do João Lara. Os meus familiares também iriam duvidar que Sua Majestade o Rei do Huambo tinha aceitado o convite para ali estar, lado a lado, e assistir à cerimónia, com a maior modéstia.

As imagens sobre a apresentação do Volume II de "Os Bantu na visão de Mafrano” na Biblioteca Provincial do Huambo falavam por si, sem ilusões nem enganos. A equipa da TPA e os fotógrafos têm os registos. O Rei do Huambo e os emissários do Rei do Bailundo estavam ali sentados e ouviam a brilhante dissertação do professor, historiador, antropólogo e linguista Venceslau Casese sobre a vida e a obra de Mafrano, aplaudido de pé!

Mas, o Huambo tinha outro grande segredo, guardado sigilosamente a sete chaves!

Para minha maior surpresa, nesse sábado, 23 de Março, às 10h, fui alertado que a Sala Magna da Biblioteca Provincial estava ocupada por outra Organização cultural que nos disse ter confirmado a sua reserva, dois meses antes. E tudo isto aconteceu apesar de nas últimas 24 horas nos terem confirmado o uso das mesmas instalações.

"…?!”, os nossos convidados, incluindo o Rei, corriam o risco de "ficar na rua!”

Mas, no aniversário do Dia da Libertação da África Austral, o bom senso falou mais alto.

Sem dar a entender qualquer aflição, apontei para o local onde estavam alguns dos convidados, com destaque para as cortes do Rei do Huambo e do Rei do Bailundo e disse:

"Será a maior vergonha para todos nós, e também para o Huambo, se estes convidados ficarem na rua. Vamos chegar a um compromisso, por favor!”

E tudo foi simples. Fizemos a nossa sessão com ligeiro atraso, relativamente à hora marcada (algo muito normal em Angola), encurtamos a cerimónia e, depois de nós, os outros continuaram…   

E, estes são de facto os Segredos do Huambo sobre a apresentação da colectânea "Os Bantu na visão de Mafrano” e a "Voz dos Dibengos”, do pequeno João Lara, doze anos depois de termos levado o "Último Segredo”.

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