Opinião

Quebrar pontes e assumir o regime de trabalho por turnos

Domingos Mucuta | Lubango

Jornalista

O mês do trabalhador chegou. Maio traz à memória acontecimentos históricos que impulsionaram, ao longo dos anos, reivindicações dos operários a nível internacional.

05/05/2024  Última atualização 10H15

O quinto mês do ano propicia, também, nos dias actuais, abordagens sobre as condições laborais e remuneratórias da classe trabalhadora.

Os trabalhadores lutam sempre para obter os melhores benefícios possíveis. Cada um dos lados "puxa a brasa para a sua sardinha” para a balança pesar a seu favor.

Esta é uma balança que certamente continuará sempre "balançada” enquanto existir, por um lado, quem procure e, por outro lado, quem ofereça emprego, pois para cada contexto económico as exigências são diferentes.

Lutas e reivindicações à parte, porque apesar de serem imprescindíveis para defesa dos direito e busca pelo bem-estar, podem tirar o foco que esta crónica da Lavra de Reflexões preconiza.

Para hoje, o foco é uma abordagem que visa despertar todos os actores da balança laboral em Angola para ponderar uma opção capaz de acelerar o nosso estágio de desenvolvimento.

A verdade é que o trabalhador será sempre fundamental, porque é a força motriz para alcançar o desenvolvimento de qualquer nação.

Os países em via de desenvolvimento precisam e precisarão por muito tempo de uma força de trabalho capaz de dinamizar os sectores da vida económica, diferente dos países desenvolvidos, onde a evolução tecnológica dispensa o envolvimento humano em algumas tarefas por causa do robot e da inteligência artificial.

Cá entre nós, seria bom abraçar políticas e estratégias económicas extraordinárias, pois para momentos excepcionais são exigidas medidas à altura, visando acelerar o desenvolvimento da economia e realizar uma viragem de 360 graus.

A par de outras políticas remuneratórias e medidas económicas em curso, é fulcral considerar também a opção de Angola adoptar o regime geral de trabalho por turnos, no sector público e semi-privado.

Isto se a nossa humildade permitir-nos reconhecer que estamos atrasados e precisamos correr para recuperar o tempo perdido. Ou seja, se quisermos sair do estágio actual para seguirmos um rumo exitoso.

Dormimos por demais. E no Provérbios 20:13, há lá um alerta sobre isso. Sou apologista de que não podemos dormir muito se quisermos andar rápido, chegar longe e de forma sustentável. O ditado Bacongo ensina que "para quem estiver afogado até o jacaré pode servir de tronco para salvacão”, com as devidas excepções e excessos, claro.

Quem aceitar trabalhos por turno pode também aceitar reduzir o número de pontes resultantes de feriados às terças e quintas-feiras já que as mesmas nos estagnam, ao invés de nos ajudar a atravessar o "leito vermelho” até à margem do desenvolvimento.

Alguns estarão contra essa posição por gostarem de estar à sombra da bananeira a curtir o feriado, num autêntico luxo na miséria. O que importa é manter-se na zona de conforto… mas, escassez e no subdesenvolvimento? Talvez,  porque é difícil vislumbrar os efeitos desta decisão?  Ou aplica-se à máxima de Carlos Castañeda segundo a qual "muita luz é como muita sombra:  Não deixa ver”?

Precisamos todos colocar as mãos na consciência para perceber que estamos muito atrás. E para andarmos e subir rapidamente para posições cimeiras devemos trabalhar duro, de forma inteligente e em equipa.

Óbvio que sem exceder as 8 horas laborais por cada trabalhador. Mas, intercalar os grupos de trabalho para que a máquina continue operacional. O dia tem 24 horas. Dividindo estas horas teríamos três turnos a trabalhar 24 horas ao dia.

É preciso sacudirmos a poeira do subdesenvolvimento. Não podemos dormir todos, sobretudo enquanto tivermos missão, metas ou resultados a cumprir. Temos que admitir que enquanto alguns saem para dormir e outros para o lazer, outras equipas devem entrar em cena.

As nossas máquinas produtivas não podem repousar demoradamente. As instituições também não. Fechar por largas 16 horas é desaconselhável para quem estiver atrás. Isto tem custos como pagar adequadamente que trabalha em períodos extraordinários. Vamos despertar para optar pela rotatividade, pela constância produtiva. Sobre isso nem precisamos de directrizes dos iluminados. Isso depende de nós. O compromisso de desenvolver ou estagnar é nosso e de mais ninguém.

Aprendamos as lições de países, empresas nacionais e multinacionais que labutam por turnos. Aliás, não é em vão que mantém uma oferta contínua no mercado, a tempo e hora, ao ponto de exportar para a satisfação do consumidor mundial. Sem trabalho por turnos a cadeia estaria interrompida e os produtos escassos.

Este Jornal não sairia hoje se não houvesse várias equipas subdivididas de repórteres, editores, paginadores, revisores, motoristas e técnicos de impressão a trabalhar por turnos para que as noticias cheguem às mãos dos leitores pela manhã cedo.

Isto requer liderança a vários níveis de gestão estratégica, recursos humanos e outros, investimentos na formação de pessoal, nas infra-estruturas, na segurança e noutros elementos do sistema económico e da cadeia produtivo nacional.

Não sei por que razão, mas acredito piamente que esta estratégia pode promover transformação. Os benefícios de assumir o regime geral de turnos serão maiores que os custos.

Teremos mais empregos, mais produtividade, geração de riqueza e maior disponibilidade de bens e serviços. É preciso começar e testar. É preciso marcar o primeiro passo nem que for de forma parcial. Talvez depois disso estejamos agradecidos por começar.

Claro que isso implica mudança de rotinas, de legislação, mas também de atitude e comportamentos, patriotismo e sobretudo  comprometimento com a causa nacional. Nada melhor que se inspirar no mês de Maio para o país considerar esta opção de quebrar as pontes e adoptar o regime geral de trabalho por turnos como estratégia valiosa para Angola começar a trilhar o rumo do desenvolvimento.

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