Cultura

O pedreiro que se mudou para o artesanato em Benguela

Arão Martins / Benguela

Jornalista

Vitorino Nguelepete é um jovem de 32 anos com habilidade para transformar materiais como borracha, corda, tecido, plástico e couro em obras únicas, demonstrando atenção aos detalhes e paixão pelo ofício de artesão. Nascido no bairro 71, nos arredores da cidade de Benguela, Victorino Nguelepete é um exímio artista na produção de sandálias, chinelas, cestos, pulseiras e outros itens artesanais.

25/04/2024  Última atualização 12H45
Arão Martins | edições novembro | Benguela © Fotografia por: DR

A confecção de produtos artesanais começou em 2007, aos 20 anos de idade, e hoje é amplamente reconhecido na cidade das "Acácias Rubras". Além de atender aos benguelenses, os seus produtos são solicitados por angolanos de diversas províncias do país, com destaque para Huíla, Namibe, Cunene, Cuando Cubango, Bié, Cuanza-Sul, Luanda, Malanje, Lunda-Sul, Zaire e Cabinda.

Vitorino também se orgulha do reconhecimento internacional do seu trabalho, tendo recebido encomendas de países como Namíbia, Portugal, Moçambique, Inglaterra e Canadá.

O jovem artesão produz sapatos e chinelos utilizando técnicas tradicionais de sapataria, que envolvem várias etapas, como corte de couro ou material sintético, costura, montagem e acabamento. Dependendo do estilo e método de produção, ele emprega técnicas adicionais, como o uso de máquinas de costura especializadas, moldagem a quente e acabamento manual.

A sua primeira obra, lembra, que levou uma semana para estar perfeita, resultou na produção de par de sandálias, vulgo luhaco feitas de pneus 15. O luhaco é um tipo de sandálias que é usada pelos povos ovimbundu, mucubais e nhaneka. Hoje, disse, é o estilo de sandálias usado por muitas pessoas, inclusive, muito procurado por turistas europeus que visitam Benguela.

Os preços dos seus produtos variam de 8 a 25 mil kwanzas. No princípio, afirmou, muitos colegas, amigos e familiares, que o conheceram como pedreiro e ladrilhador, tentaram compreender o porquê da mudança de profissão, já que a construção civil é que dá mais dinheiro.

De família humilde

De origem humilde, Vitorino aprendeu a profissão de artesão dentro do movimento de rastas em Benguela, que produz uma variedade de peças artesanais. Antes de se tornar artesão, ele trabalhou como pedreiro e ladrilheiro, por influência da profissão do seu pai, contribuindo para a construção de importantes edifícios e infra-estruturas na região. Em Benguela, participou na construção do prédio amarelo, conhecido por Poli Obra, do Estádio Nacional de Ombaka, que organizou uma das fases do Campeonato Africano das Nações, que o país albergou em 2010. Também esteve na construção do Hospital Municipal de Benguela, localizado no seu bairro de origem e na reabilitação do Estádio São Filipe, de Benguela.

Ele conta que mesmo com o sucesso que teve na área de construção civil, ainda assim, mediante influência de um irmão rasta, aliado à sua inclinação na área, participou numa formação de curta duração, pelas artes, ministrada pelo mestre Rafael Sequeira, antigo presidente do polo do artesanato de Benguela (em memória).

Hoje, Vitorino é uma referência em artesanato na província de Benguela, tendo beneficiado de um quiosque, o número K-5, localizado na marginal da Praia Morena, construído pelo Governo Provincial. Os seus produtos são muito procurados, tanto por angolanos residentes na Europa quanto por turistas que visitam a região.

Pai de cinco crianças, Vitorino afirma que é possível sustentar a família com o artesanato, proporcionando educação e sustento para os seus filhos. Ele valoriza o reconhecimento e a demanda pelo seu trabalho, que inclui não apenas a produção de novos itens, mas também reparos em sapatos, chinelos e acessórios danificados.

Apesar das críticas iniciais e da pressão para permanecer na construção civil, Vitorino seguiu a sua paixão pelo artesanato e hoje colhe os frutos do seu trabalho, sendo reconhecido nacional e internacionalmente como um talentoso artesão. O seu objectivo é agora compartilhar os seus conhecimentos e as suas habilidades com outros jovens desempregados, incentivando o crescimento do sector artesanal na região.

A acção do governador provincial de Benguela, Luís Nunes, foi fundamental para impulsionar a vida dos artesãos locais, proporcionando espaços de exposição e venda dos seus produtos. Vitorino destaca a importância deste apoio para a comunidade artesanal e para a promoção da cultura local.

Mudança abortada

Num encontro de intercâmbio entre angolanos e brasileiros, que actuam nas áreas das artes, entre artesanato, poesia e outros, decorrido em Benguela, Vitorino Nguelepete foi convidado a mudar-se para o Brasil.

Apesar de um convite tentador, Vitorino optou por permanecer na sua terra natal, priorizando a sua família e o seu trabalho como artesão em Benguela.

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